Poeta Ferreira Gullar morre aos 86 anos no Rio de Janeiro

  • Por Jovem Pan com Agência Brasil
  • 04/12/2016 11h53
Renato Cobucci/Imprensa MG (10/06/2014) Ferreira Gullar

O poeta, escritor, jornalista e teatrólogo Ferreira Gullar morreu aos 86 anos neste domingo (4) no Rio de Janeiro, devido a problemas pulmonares. Um dos maiores escritores brasileiros, Ferreira Gullar foi eleito para a Academia Brasileira de Letras (ABL) em 2014, e marcou a cultura brasileira. 

Ferreira Gullar, cujo nome verdadeiro é José de Ribamar Ferreira, nasceu em São Luís do Maranhão em 10 de setembro de 1930, numa família de classe média pobre. Dividiu os anos da infância entre a escola e a vida de rua, jogando bola e pescando no Rio Bacanga. Considera que viveu numa espécie de paraíso tropical e, quando chegou à adolescência, ficou chocado em ter de tornar-se adulto, e tornou-se poeta.

No começo, acreditava que todos os poetas já haviam morrido e somente depois descobriu que havia muitos deles em sua própria cidade, a algumas quadras de sua casa. Com 18 anos, passou a frequentar os bares da Praça João Lisboa e o Grêmio Lítero-Recreativo, onde, aos domingos, havia leitura de poemas.

Descobriu a poesia moderna apenas aos 19 anos, ao ler os poemas de Carlos Drummond de Andrade e Manuel Bandeira. Ficou escandalizado com esse tipo de poesia e tratou de informar-se, lendo ensaios sobre a nova poesia.

Pouco depois, aderiu a ela e adotou uma atitude totalmente oposta à que tinha anteriormente, tornando-se um poeta experimental radical, que tinha como lema uma frase de Gauguin: “Quando eu aprender a pintar com a mão direita, passarei a pintar com a esquerda, e quando aprender a pintar com a esquerda, passarei a pintar com os pés”.

Ou seja, nada de fórmulas: o poema teria que ser inventado a cada momento. “Eu queria que a própria linguagem fosse inventada a cada poema”, diria ele mais tarde. Assim nasceu o livro que o lançaria no cenário literário do país em 1954: A Luta Corporal.

Os últimos poemas deste livro resultam de uma implosão da linguagem poética e provocariam o surgimento na literatura brasileira da “poesia concreta”, de que Gullar foi um dos participantes e, em seguida dissidente, passando a integrar um grupo de artistas plásticos e poetas do Rio de Janeiro: o grupo neoconcreto.

O movimento neoconcreto surgiu em 1959, com um manifesto escrito por Gullar, seguido da teoria do não-objeto. Esses dois textos fazem hoje parte da história da arte brasileira, pelo que trouxeram de original e revolucionário. São expressões da arte neoconcreta as obras de Lygia Clark e Hélio Oiticica, hoje nomes mundialmente conhecidos.

Experiências

Gullar levou suas experiências poéticas ao limite da expressão, criando o Livro-Poema e, depois, o Poema Espacial, e, finalmente, o Poema Enterrado. Este consiste em uma sala no subsolo a que se tem acesso por uma escada; após penetrar no poema, deparamo-nos com um cubo vermelho; ao levantarmos este cubo, encontramos outro, verde, e sob este ainda outro, branco, que tem escrito numa das faces a palavra “rejuvenesça”.

poema enterrado foi a última obra neoconcreta de Gullar, que afastou-se do grupo e integrou-se na luta política revolucionária. Entrou para o Partido Comunista e passou a escrever poemas sobre política e participar da luta contra a ditadura militar que havia se implantado no país, em 1964. Foi processado e preso na Vila Militar. Mais tarde, teve de abandonar a vida legal, passar à clandestinidade e, depois, ao exílio. Deixou clandestinamente o país e foi para Moscou, depois para Santiago do Chile, Lima e Buenos Aires.

Voltou para o Brasil em 1977, quando foi preso e torturado. Libertado por pressão internacional, voltou a trabalhar na imprensa do Rio de Janeiro e, depois, como roteirista de televisão.

Teatro

Durante o exílio em Buenos Aires, Gullar escreveu Poema Sujo, um longo poema de quase cem páginas e que é considerado  sua obra-prima. Esse poema causou enorme impacto ao ser editado no Brasil e foi um dos fatores que determinaram a volta do poeta a seu país. Poema Sujo foi traduzido e publicado em várias línguas e países.

De volta ao Brasil, Gullar publicou, em 1980, Na vertigem do dia e Toda Poesia, livro que reuniu toda sua produção poética até então. Voltou a escrever sobre arte na imprensa do Rio e São Paulo, publicando, nesse campo, dois livros Etapas da arte contemporânea (1985) e Argumentação contra a morte da arte (1993), onde discute a crise da arte contemporânea.

Outro campo de atuação de Ferreira Gullar é o teatro. Após o golpe militar, ele e um grupo de jovens dramaturgos e atores fundou o Teatro Opinião, que teve importante papel na resistência democrática ao regime autoritário. Nesse período, escreveu, com Oduvaldo Vianna Filho, as peças Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come e A saída? Onde fica a saída? De volta do exílio, escreveu a peça Um rubi no umbigo, montada pelo Teatro Casa Grande em 1978.

Gullar afirmava que a poesia era sua atividade fundamental. Em 1987, publicou Barulhos e, em 1999, Muitas Vozes, que recebeu os principais prêmios de literatura daquele ano. Em 2002, foi indicado para o Prêmio Nobel de Literatura.

Veja, abaixo, os livros publicados por Ferreira Gullar

Poesia

“Um pouco acima do chão” (1949)

“A luta corporal” (1954)

“Poemas” (1958)

“João Boa-Morte, cabra marcado para morrer” [cordel] (1962)

“Quem matou Aparecida?” [cordel] (1962)

“A luta corporal e novos poemas” (1966)

“Por você, por mim” (1968)

“Dentro da noite veloz” (1975)

“Poema sujo” (1976)

“Na vertigem do dia” (1980)

“Crime na flora ou ordem e progresso” (1986)

“Barulhos” (1987)

“Formigueiro” (1991)

“Muitas vozes” (1999)

Crônica

“A estranha vida banal (1989)

Infantil e juvenil

“Um gato chamado gatinho” (2000)

“O menino e o arco-íris” (2001)

“O rei que mora no mar” (2001)

“O touro encantado” (2003)

“Dr. Urubu e outras fábulas” (2005)

Conto

“Gamação” (1996)

“Cidades inventadas” (1997)

Memória

“Rabo de foguete” (1998)

Biografia

“Nise da Silveira” (1996)

Ensaio

“Teoria do não-objeto” (1959)

“Cultura posta em questão” (1965)

“Vanguarda e subdesenvolvimento” (1969)

“Augusto dos Anjos ou morte e vida nordestina” (1976)Aê

Uma Luz no Chão – 1978

Sobre Arte – 1982

Etapas da Arte Contemporânea: do Cubismo à Arte Neoconcreta – 1985

Indagações de Hoje – 1989

Argumentação Contra a Morte da Arte – 1993

Relâmpagos – 2003

Sobre Arte, sobre Poesia – 2006

Teatro

Se Correr o Bicho Pega, se Ficar o Bicho Come – 1966 – com Oduvaldo Vianna Filho

A saída? Onde fica a Saída? – 1967 – com Antônio Carlos Fontoura e Armando Costa

Dr. Getúlio, Sua Vida e Sua Glória – 1968 – com Dias Gomes

Um rubi no umbigo – 1978

O Homem como Invensão de si Mesmo – 2012

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