“Odiado”, Piqué vira centro da histórica rivalidade Catalunha x Madri; entenda

  • Por Lucas Reis/Jovem Pan
  • 10/09/2015 11h43
Facebook/Reprodução Nascido na Catalunha

Poucos clássicos no futebol mundial ultrapassam a rivalidade esportiva e ganham aspectos políticos como Barcelona x Real Madrid. Carregado de história dentro e fora das quatro linhas, o superclássico espanhol é aquecido pelo conflito entre a região da Catalunha e Madri, que nos últimos tempos foi requentado pelo zagueiro Gerard Piqué. Vaias têm sido cada vez mais comuns para o jogador, que se transformou no centro de uma disputa política histórica e se credencia como um dos jogadores mais “odiados” do país.

Declarações como a frase de 2011, antes da final da Copa do Rei entre Real e Barça: “espanhoizinhos, vamos ganhar a copa do seu rei”, mostram que Piqué é um grande apoiador da independência catalã e não perde a oportunidade de alfinetar os madrilenhos.

Dentro de campo, Piqué se torna ícone do debate que voltou a ganhar força na Espanha. Para entender o conflito Catalunha x Madri, o Jovem Pan Online conversou com o historiador e comentarista da Jovem Pan Marco Antonio Villa, que explicou a divergência que extrapola o campo político e chega ao futebol. 

Confira:

Muito antes de Piqué nascer: o início da rivalidade entre Barcelona e Real Madrid

A rivalidade entre barcelonistas e merengues ganhou força no final dos anos 30, início dos anos 40, quando a Espanha viveu sob a ditadura do general Francisco Franco. As duas equipes, que já eram as principais do país na época, se tornaram símbolos da disputa política no país: de um lado estava o Real Madrid, clube que sempre contou com a simpatia da realeza e do governo, simbolizando a Espanha como Estado maior. Enquanto isso, do lado oposto, o Barcelona se tornou um ícone da resistência catalã que pede a independência até os dias atuais.

Governante espanhol entre 1939 e 1975, Franco, fã do Real Madrid, utilizou o clube da capital como aliado do governo. Durante a ditadura franquista, os merengues ganharam espaço na TV estatal, enquanto o Barcelona viveu sob muitos problemas, inclusive a morte de um dos seus presidentes, Josep Sunyol, assassinado por ter convicções de esquerda. No período, o Real viveu os grandes momentos de sua história, se tornando uma das principais equipes do planeta.

Com origem no campo político, o conflito regional é levado aos gramados e transcende as disputas entre Real e Barça. Para o historiador Marco Antonio Villa, as duas equipes levam a questão política para os jogos e o conflito é discutido até nas conquistas da seleção espanhola: “os dois grandes times reforçam essa questão e acabam misturando futebol e política. Envolvem ainda a questão da seleção da Espanha. Quem ganha os títulos? A Espanha ou os jogadores de diversas regiões? É uma questão muito complicada”.

Histórico: 

As regiões onde hoje ficam a Catalunha e Madri foram fundamentais para a composição da Espanha, a partir do casamento de Fernando de Aragão (onde é a Catalunha hoje) e Isabel de Castela (atual Madri) em 1469. Os territórios permaneceram unidos até o século XX, quando, nos anos 30, aconteceu a Guerra Civil Espanhola, momento em que, segundo Villa, ficam evidentes as divisões entre as regiões espanholas. “Na guerra civil já esta bem clara a questão das autonomias das regiões, como a Catalunha e a região basca”, afirma.

“Quando vem a ditadura franquista, que se estende até os anos 70, o estado central, em Madri, foi reprimindo todos os movimentas autônomos. Na redemocratização, em 1975, com o rei Juan Carlos, é votada uma constituição que dá uma relativa autonomia para essas regiões, questão que vai se agravando no final do século XX e início do século XXI, e no caso da Catalunha, hoje há um forte movimento separatista”, completa.

Situada no nordeste da Espanha, a Catalunha possui população com mais de 7,5 milhões de pessoas em território com cerca de 32 mil km². Assim como Piqué, outros importantes jogadores do futebol mundial nasceram em terras catalãs. Nomes como Fábregas, hoje no Chelsea, Victor Valdés, Xavi e Puyol são catalães, além do treinador Pep Guardiola.

Diversas disputas econômicas e culturais incentivam o povo catalão a pedir a separação da região que julga dar mais do que receber do governo. Para Villa, os fortes laços culturais dos catalães explicam as posições do povo que pede a independência da região e o idioma simboliza bem essa posição.

“Existe uma identidade cultural muito forte nas regiões espanholas. Na Catalunha, tem a questão do idioma, por exemplo, de falar o catalão. Nas Olimpíadas de 1992, em Barcelona, tudo era escrito em inglês, francês, espanhol e também em catalão. Reforçam a questão da bandeira da Catalunha. Tem a preservação desses valores regionais muito fortes”, explica.

O futuro

De acordo com o historiador, a independência da Catalunha, apoiada por importantes nomes do esporte espanhol como o próprio Piqué, além de Guardiola, que hoje treina o Bayern de Munique, não deve se concretizar e não seria uma boa saída para a região espanhola.

“Qualquer possibilidade de independência da Catalunha é a maior bobagem. A Espanha tem muitos problemas e achar que a Catalunha vai ser rica dividida? Pode tirar o cavalo da chuva. As secessões que ocorreram em alguns países da Europa foram negativas: a Eslováquia saiu a Republica Tcheca dizendo ser explorada, e hoje é um nada na Europa. Na Espanha, não há unidades como havia na Iugoslávia. No caso da Espanha, temos apenas alguns pontos de unidade. Não acredito que a maior parte catalã seja totalmente favorável a autonomia”, comenta.

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