Ex-rapper tenta combater preconceito religioso com mesquita em favela de SP

  • Por EFE
  • 23/02/2018 08h59
EFE/Fernando Bizerra Jr. Cesar Matheus (esq.) faz suas orações em mesquita em favela de Embu das Artes, onde luta contra o preconceito

Entre vielas e barracos de uma favela, um ex-rapper fala do Islã em uma pequena mesquita na Grande São Paulo, onde, segundo ele, é preciso lutar diariamente contra o preconceito.

Localizada na Favela Cultura Física, em Embu das Artes, a mesquita recebe semanalmente de 30 a 60 pessoas, a maioria delas brasileiras. Sumayyah Bint Khayyat, uma mártir que preferiu morrer a renunciar à sua fé, é o nome do tempo, criado por César Matheus, o ex-rapper e ativista que cresceu na favela e encontrou no Islã um refúgio.

Depois de anos no mundo da música e de passar por várias religiões, seu primeiro contato com o Islã aconteceu no fim da década de 80 através de um livro do ativista americano Malcolm X e há 12 anos ele se converteu e passou a se chamar César Kaab Abdul.

Foi nessa época que decidiu abrir uma sala de orações (haram) em uma comunidade de Embu das Artes, cidade que em 2003 chegou a ser considerada uma das mais violentas do país.

“Fui à Meca, na Arábia Saudita, e tive a oportunidade de fazer o caminho que Malcolm X fez, de largar as drogas e o cigarro. Isso foi muito importante para mim e me abriu um espaço de conhecimento e de troca com pessoas de diferentes realidades”, contou ele à Agência Efe.

A partir daí, segundo ele, tudo mudou. “Parei de frequentar bares, deixei de acompanhar os encontros de hip-hop. Parei de beber, de fumar. Foi uma luta e aí descobri o que é jihad”.

Jihad também foi o nome usado para batizar o grupo de rap (Jihad Brasil), que tenta diminuir os preceitos com o Islã.

“Jihad não é terrorismo, é algo totalmente diferente do que os meios de comunicação falam. As minhas letras diziam totalmente o oposto do que as pessoas pensam”, explicou.

Enquanto as letras soavam, César construiu a mesquita em meio a olhares de reprovação da comunidade que, até aquela época, não tinha muçulmanos.

“As pessoas perguntavam como podia ter um muçulmano na favela, um rapper, que passava o dia brigando com todo mundo do meio político… Falaram muitas coisas negativas sobre mim, inclusive que eu era terrorista”, lembrou.

A sala de oração começou a ser frequentada aos poucos por conhecidos dele, até que, há alguns anos, conseguiu um pequeno prédio cedido de dois andares.

A mesquita fica em frente a uma igreja evangélica, o que, segundo César, demonstra a convivência harmônica das religiões na favela, apesar de o desconhecimento ainda provocar preconceitos dentro e fora da Cultura Física.

Fato que Vera Freire, uma das frequentadoras da mesquita, também nota.

“Existe muito preconceito no Brasil, principalmente com o véu. As pessoas não conhecem o Islã. Quando sentamos e conversamos é diferente, mas antes nos insultam, dizem que somos mulher-bomba, perguntam o que estamos fazendo aqui, dizem que devemos voltar para o nosso país”, lamentou.

Para lutar contra o preconceito, César também criou o grupo “Dawa – Muçulmanos Mochileiros”, que percorre o país para passar informações sobre a religião.

“É um ato de conhecimento e não de convencimento”, defendeu.

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