Corregedoria investiga 11 PMs por achacar traficantes e revender drogas em SP

  • Por Agência Estado
  • 01/02/2016 09h53
Reprodução/ Google Maps 2º Batalhão de Polícia Militar Metropolitano (2º BPM/M) na Vila Esperança

A Corregedoria da Polícia Militar investiga policiais do 2º Batalhão, na zona leste de São Paulo, por suspeita de formação de quadrilha. Onze PMs foram indiciados por achacar traficantes, roubar drogas de pontos de tráfico para revender depois, forjar flagrantes em troca de propina, cobrar mensalidade de casas de bingo e até matar. Na maioria dos crimes, eles estavam em serviço.

O inquérito policial militar da Corregedoria, ao qual a reportagem teve acesso com exclusividade, mostra que os crimes foram descobertos, ao longo de nove meses, por meio de escutas autorizadas pela Justiça.

Em dezembro, foram decretadas as prisões da tenente Beatriz Marandola da Silva; dos cabos Bruno Marandola da Silva (seu irmão), Ricardo de Nofre, Raphael Mendes Sparapani Oliva, Erick da Silva Andrade, Pedro Henrique Santos da Silva; dos soldados Aquiles da Silva Duarte, Rafael Lima de Albuquerque, Marcio Henrique de Campos, Anderson Teixeira Lopes; e do sargento Reinaldo Luiz José de Lima. Erick e Pedro pertencem ao 29º BPM.

A apuração começou em abril do ano passado, depois que os promotores do Grupo Externo de Controle da Atividade Policial (Gecep) acionaram a Corregedoria quando descobriram que PMs estavam agindo com um informante que se passava por investigador do Departamento de Investigações Criminais (Deic) para cobrar propina de criminosos. Segundo o grupo, o falso policial apurava nomes e endereços de bandidos, principalmente traficantes, para que os PMs exigissem dinheiro. Em seguida, faziam a partilha.

Escutas revelaram que um criminoso, relutante em dar dinheiro para os PMs, pode ter sido assassinado.

A apuração concluiu que eles descobriram que o informante era um falso policial e passaram a extorqui-lo. Ele, em depoimento aos promotores, revelou que pagou R$ 35 mil para não ser preso ou denunciado.

Sequência de crimes

De abril a dezembro do ano passado, os suspeitos praticaram pelo menos dez crimes, segundo as investigações da Corregedoria.

Em agosto, segundo o órgão, a tenente Beatriz e os demais PMs de sua equipe tentaram forjar flagrante de tráfico de drogas contra dois jovens que foram pegos com R$ 28.780,00 em uma sacola e uma pequena porção de maconha.

As escutas mostram que o cabo Bruno se prontificou a buscar um quilo de maconha na casa do soldado Albuquerque para imputar mais crimes aos jovens. “Se for precisar mesmo, eu te ligo”, disse a tenente em conversa por celular com seu irmão. Ela desistiu da ideia.

No mês seguinte, os cabos Bruno, Nofre e o soldado Albuquerque abordaram dois suspeitos em um ponto de tráfico em Ermelino Matarazzo, na zona leste, mas apenas um foi preso.

Eles disseram no 24º DP que o rapaz foi surpreendido com 20 trouxas de maconha, R$ 65 e 135 pinos de cocaína. As escutas, porém, revelaram uma história diferente. O rapaz, na verdade, foi pego depois de comprar duas pequenas porções de um traficante conhecido como “Tô”. Os dois foram achacados pelos PMs, que exigiram mais drogas, armas e dinheiro para liberá-los. O traficante pagou a exigência e foi solto. O rapaz ficou preso. Se fosse levado ao DP com duas porções de maconha, seria considerado usuário.

Negociação

Os corregedores também flagraram o cabo Raphael negociando porções de cocaína. Em outubro, ele telefona para um amigo e diz que pegou 20 pinos da droga prontas para venda. Em outra ligação, ele revela que conseguiu a cocaína depois de um acordo com traficantes. Para a Corregedoria, o PM roubou a droga.

Ainda em outubro, os soldados Campos e Lopes localizaram um casa de bingo, na Ponte Rasa, zona leste. Segundo a Corregedoria, os PMs junto com o sargento Lima pediram propina ao proprietário para não levar o caso até o DP. Por telefone, Lopes diz para Campos “arrebentar” e pedir “cincão” (R$ 5 mil) por mês.

Funcionários do local confirmaram aos corregedores que, no dia da blitz, os policiais conversaram com o proprietário em um local reservado e foram embora em seguida. Os depoimentos aconteceram apenas em janeiro, quando o endereço do bingo foi descoberto. A Corregedoria apreendeu máquinas caça-níqueis.

Na semana passada, a Justiça Militar mandou soltar a tenente Beatriz e os cabos Pedro e Erick. Eles respondem em liberdade. Os demais continuam no Presídio Militar Romão Gomes.

Suspeitos negam todas as acusações

Em depoimento à Corregedoria da Polícia Militar, todos negaram as acusações. O soldado Aquiles da Silva Duarte e o cabo Bruno Marandola, acusados de pedir propina a um informante após descobrir que ele se passava por investigador, afirmaram ao órgão que o assunto discutido entre eles era sempre um serviço extra no setor de segurança privada. Eles negaram a extorsão e o soldado afirmou que pediu o dinheiro para cobrar uma dívida.

A tenente Beatriz Marandola, o cabo Bruno e o soldado Rafael Lima de Albuquerque negaram a intenção de forjar um flagrante de tráfico. Eles disseram aos corregedores que receberam denúncia sobre onde estaria escondido um quilo de maconha e queriam repassar a informação para a tenente. A oficial disse que pode ter ocorrido uma confusão na interpretação dos corregedores, pois ela participa de vários grupos de conversa online.

Sobre a prisão de um suposto usuário de drogas com flagrante forjado e a soltura de um traficante depois de pagamento de propina, o cabo Bruno, o soldado Rafael e o cabo Ricardo de Nofre reafirmaram, em depoimento, o que disseram na delegacia: apenas o rapaz foi flagrado com drogas.

O cabo Raphael Mendes Sparapani Oliva negou ser dono ou que pretendesse vender 20 pinos de cocaína. Segundo ele, ao se referir a “20”, ele falava de 20 engradados de água.

O sargento Reinaldo Luiz José de Lima negou ter pedido dinheiro ao proprietário da casa de jogos de azar. Apenas admitiu a conversa com ele. O soldado Márcio Henrique Campos ficou em silêncio no depoimento. O soldado Anderson Teixeira Lopes disse que as conversas interceptadas sobre valores se tratam de um bico de segurança.

A reportagem não localizou os advogados dos investigados. A Secretaria da Segurança Pública informou que eles respondem por crimes de ameaça, violação do dever funcional com fins de lucro, concussão, prevaricação e falsidade ideológica. Após a conclusão do inquérito, eles vão passar por procedimento administrativo demissório para avaliação de conduta, que pode resultar em demissão ou expulsão da corporação.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Por Alexandre Hisayasu

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