Dilma tinha conhecimento de caixa 2 para campanha de 2014, dizem marqueteiros

  • Por Jovem Pan com Estadão Conteúdo
  • 24/04/2017 20h55
Brasília - A presidenta afastada, Dilma Rousseff, faz sua defesa durante sessão de julgamento do impeachment no Senado (Marcelo Camargo/Agência Brasil) Marcelo Camargo/ Agência Brasil Dilma Rousseff

A ex-presidente Dilma Rousseff (PT) tinha conhecimento dos pagamentos ilícitos feitos para a sua campanha eleitoral em 2014, disseram nesta segunda-feira, 24, o casal de marqueteiros João Santana e Mônica Moura em depoimento sigiloso no Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, em Salvador. Segundo o casal de delatores, não foi tratado de assuntos financeiros da campanha com Michel Temer, então candidato a vice. Mônica e Santana foram condenados pelo juiz Sérgio Moro a oito anos e quatro meses de prisão pelos crimes de lavagem de dinheiro no esquema de corrupção na Petrobras.

Santana conversou com a então presidente da República em meados de maio de 2014 sobre os pagamentos que seriam feitos via caixa 2. O atraso nos repasses foi tratado posteriormente por Mônica em encontros com Guido Mantega e Edinho Silva, ex-tesoureiro da campanha.

A presidente também quis saber do casal se era seguro o pagamento feito por meio de uma conta no exterior, de acordo com relatos feitos à reportagem.

O casal, responsável pelas campanhas de Dilma em 2010 e 2014, prestou depoimento ao ministro Herman Benjamin, no âmbito da ação que apura se a chapa de Dilma-Temer cometeu abuso de poder político e econômico para se reeleger. A audiência começou por volta das 9h20, sendo que Mônica foi a primeira a deixar o local, ao meio-dia. Já Santana deixou a sede do TRE um pouco antes das 15h.

De acordo com os depoimentos colhidos, a Odebrecht teria acertado pagar R$ 70 milhões ao casal via caixa 1 e outros R$ 35 milhões por meio de caixa 2. Da parte não contabilizada, os marqueteiros só teriam recebido algo entre R$ 10 milhões e R$ 12 milhões, deixando uma “dívida” na casa de R$ 25 milhões. O restante do pagamento, que seria feito usando uma conta no exterior, teria ficado comprometido com o avanço da Operação Lava Jato.

Delatores

Em depoimento prestado ao TSE no mês passado, o ex-executivo da Odebrecht Hilberto Mascarenhas – que chefiou de 2006 a 2015 o Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht, conhecido como departamento da propina da empreiteira – havia dito que todo o contato de pagamento ao casal era feito com Mônica, que estaria entre os “top five” – na lista dos cinco maiores recebedores de dinheiro do setor de propinas.

De acordo com outro delator da empresa, o ex-diretor de Crédito à Exportação da Odebrecht Engenharia e Construção João Nogueira, o empreiteiro Marcelo Odebrecht teria enviado à presidente Dilma Rousseff, por meio do governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT), documentos que demonstravam o caixa dois em sua campanha de 2014. Segundo Nogueira, Marcelo viajou a Belo Horizonte em 17 de dezembro de 2014 e lá se encontrou com Pimentel. Naquela ocasião, teria apresentado ao petista o material sobre os repasses ilegais à chapa Dilma-Michel Temer. 

O delator explicou que o recado foi levado a Dilma, conforme lhe teria dito o próprio Pimentel numa conversa posterior, também em BH. Dilma teria pedido a Giles Azevedo, um de seus auxiliares mais próximos, para ficar “em cima do tema contribuições”.

Em um dos seus depoimentos prestados no âmbito do acordo de colaboração premiada com a Lava Jato, Marcelo assumiu pagamentos de propina para o PMDB e o PT por conta do contrato PAC SMS da diretoria Internacional da Petrobras. Segundo o delator, tanto a ex-presidente da estatal Graça Foster como a ex-presidente foram informadas sobre os pagamentos ilícitos. 

Na conversa com Dilma, segundo Marcelo, teria transparecido que a então presidente queria saber se seu vice, Michel Temer, teria recebido valores oriundos do contrato.

Assalto

O ex-assistente do casal André Santana relatou no TSE nesta segunda, 24, a logística dos pagamentos não contabilizados efetuados pela Odebrecht. Responsável por recolher o dinheiro em espécie na maior parte das vezes, André teria sido assaltado ao deixar um hotel de São Paulo após receber um pagamento de R$ 1,5 milhão.

Os depoimentos de Santana, Mônica e André foram pedidos pelo vice-procurador-geral eleitoral, Nicolao Dino.

Relator dos processos da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Edson Fachin homologou no dia 4 deste mês o acordo de colaboração premiada dos três.

Procurada pela reportagem, a defesa do casal informou que reitera o “compromisso de colaborar com a Justiça” e ressaltou que “os depoimentos prestados permanecem em sigilo tendo em vista a determinação do STF”.

Defesas

Em nota, o advogado Eugênio Pacelli, que defende o governador de Minas, afirmou que, sobre esses fatos, “parece muito fácil demonstrar que o delator nada diz de concreto”. “Afirma ter mandado recado à ex-presidente, recado esse que seria a comprovação de que ele poderia se transformar em um delator, se algo não fosse feito. Pela lógica dele, nada se fez. Transformou-se em um. Melhor: no principal delator”, diz a nota

“O governador Fernando Pimentel esclarece que sempre teve consciência da impossibilidade de qualquer interferência política na condução da Lava Jato. E foi esse o seu comportamento desde sempre. Tanto o juiz Sérgio Moro, quanto os membros do Ministério Público Federal são constitucionalmente independentes e não podem sofrer qualquer tipo de influência em seus atos. Jamais relataram algo nesse sentido em relação ao governador”, completa. O advogado também diz que é importante ressaltar que também não houve iniciativa legislativa da ex-presidente para qualquer fim contrário às investigações. “Precisamos de mais fatos e menos boatos!”, finaliza.

Também em nota, a defesa da ex-presidente diz que os marqueteiros mentiram no depoimento feito ao ministro Herman Benjamin e alegou falta de provas. O documento ainda diz que o casal deve ter “sido induzido a delatar fatos inexistentes, com o objetivo de ganhar sua liberdade e de atenuar as penas impostas por uma eventual condenação futura”. Confira abaixo a íntegra do comunicado:

NOTA À IMPRENSA

Sobre os depoimentos de João Santana e Mônica Moura

Sobre os depoimentos sigilosos prestados pelo casal João Santana e Monica Moura, nesta segunda-feira, 24 de abril, perante a Justiça Eleitoral, a Assessoria de Imprensa de Dilma Rousseff esclarece:

1. João Santana e Monica Moura faltaram com a verdade no depoimento colhido pelo ministro relator Herman Benjamin, fazendo afirmações desprovidas de qualquer fundamento ou prova. 

2. Dilma Rousseff nunca negociou diretamente quaisquer pagamentos em suas campanhas eleitorais, e sempre determinou expressamente a seus coordenadores de campanha que a legislação eleitoral fosse rigorosamente cumprida respeitada.

3. Tudo indica que o casal, por força da sua prisão por um longo período, tenha sido induzido a delatar fatos inexistentes, com o objetivo de ganhar sua liberdade e de atenuar as penas impostas por uma eventual condenação futura.

4. As evidências demonstram que, pelos pagamentos declarados ao TSE pela campanha de Dilma Rousseff de 2014, João Santana e Monica Moura foram os profissionais de marketing mais bem pagos na história das eleições no Brasil, recebendo nada menos que R$ 70 milhões de reais.

5. Desse modo, não havia e nunca houve qualquer razão ou motivo para que o casal recebesse nenhum centavo a mais pelos serviços prestados à campanha da reeleição, especialmente nos montantes pretendidos por Mônica Moura e muito menos por meio de pagamentos não contabilizados.

6. A presidenta eleita Dilma Rousseff repudia, mais uma vez, o vazamento seletivo de trechos dos depoimentos, renovando a necessidade de rigorosa investigação pela Justiça Eleitoral, como a sua defesa denunciara em outra oportunidade.

ASSESSORIA DE IMPRENSA
DILMA ROUSSEFF

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