Supremo julga caso de preso que pede indenização por maus tratos

  • Por Jovem Pan
  • 06/05/2015 14h58
Rodrigo Freitas CCOM-MPMA (23/10/2013) Presídio de Pedrinhas

Será retomado na tarde desta quarta (06) no Supremo Tribunal Federal o julgamento sobre a indenização de R$ 2 mil ao mês ao preso Anderson Nunes da Silva, por danos morais devido a superlotação carcerária. Os ministros Teori Zavascki relator do processo e Gilmar Mendes já proferiram seus votos favoravelmente ao detento, alegando que é preciso manter os padrões mínimos de humanidade e que a decisão poderia estimular uma agenda positiva para melhorar a situação dos presídios. O julgamento será retomado logo mais após ser suspenso devido a pedido de vista do ministro Luis Roberto Barroso.

O presídio a que a ação se refere está no município de Corumbá e tem capacidade para 262 pessoas, mas abriga 674. Laudo técnico aponta que há “rachaduras nas paredes, utensílios de cozinha e padaria sem condições de uso; dejetos, sólidos e líquidos, são lançados juntamente com os do estabelecimento penal feminino, nas calçadas, e não vêm sendo tratados em face do defeito na bomba supressora, ficando a céu aberto, ocasionado mau cheiro insuportável, colocando em risco a saúde das pessoas que ali têm contato”. Além disso, não há lugar nas celas para colchões porque inviabiliza a circulação no ambiente.

Procurador do estado do Mato Grosso do Sul, onde a ação foi impetrada, Ulisses Schwarz Viana entende que, se o presidiário vencer a causa, abrir-se-á um precedente que pode causar um “rombo nas contas públicas” e impedirá a melhora de unidades prisionais já existentes e a construção de novas edificações.

“Há setores prisionais no Brasil, como os presídios femininos, onde não há superlotação carcerária, existem prisões-modelo no Brasil, onde não há esse quadro”, disse. “Se (o processo) for acolhido de forma linear, nós vamos acabar indenizando inclusive presos que não estão nessa situação”, avalia o procurador de Mato Grosso. “Isso vai gerar um custo financeiro enorme para o Estado e vai tirar os recursos necessários para a construção dos presídios.”

O ministro Gilmar Mendes, um dos que já votou em favor do preso Anderson da Silva, rebateu o argumento das contas públicas: “Talvez seja mais baratos construir presídios. Evitar que presos fiquem acumulados num espaço pequeno, usar as tornozeleiras eletrônicas; em suma: criar um sistema integrado de justiça criminal”, disse. “A Constituição dá base para a ideia da responsabilidade civil do Estado nesse caso”, avaliou.

O defensor público federal Gustavo Zortea da Silva, que tem atuação no STF, entende que “esse caso é paradigmático, porque ele pode mudar, ou criar algum início de mudança no sistema carcerário brasileiro”. Ele concorda com a decisão de Mendes. “Nós entendemos que é necessário responsabilizar o Estado pela superpopulação carcerária e pela sujeição dos presos a condições de saúde e higiene precários”.

Veja outros argumentos do ministro do Supremo, do procurador do estado-réu na ação (Mato Grosso do Sul) e do defensor público

Gilmar Mendes, ministro do STF

“Nós temos mais de R$ 1 bilhões no sistema FUNPEN (Fundo Penitenciário Nacional), mas não temos vagas adequadas no sistema prisional”, criticou Mendes, citando o caixa criado no Ministério da Justiça destinado à “modernização e aprimoramento” do sistema prisional, conforme a lei que o criou em 1994.

“Esse é um tema que precisa entrar na nossa agenda”, disse o ministro, falando sobre o sistema carcerário. “É preciso cobrar dos setores responsáveis uma ação positiva dessa seara”

Gustavo Zortea da Silva, defensor público federal, com atuação no STF

“Nós entendemos que é necessário responsabilizar o Estado pela superpopulação carcerária e pela sujeição dos presos a condições de saúde e higiene precários”.

“A ideia é que, no momento em que pesar no bolso do Estado, será possível uma agenda positiva de respeito aos direitos dos presos, respeito à dignidade dos presos e de cumprimento da Lei de Execuções Penais”.

“Esse argumento de rombo nas contas só poderia ser invocado no momento em que houvesse uma garantia de condições mínimas nos presídios, que, hoje, nós sabemos que não existe”.

“O respeito às garantias dos presos está acima desse argumento de eventual rombo nas contas públicas”.

Ulisses Schwarz Viana, Procurador do estado do Mato Grosso do Sul

“Estamos com pouco dinheiro para fazer o investimento que acompanhe a progressão do número de presos que temos em nossas prisões”

“Estamos trabalhando no sentido de sensibilizarmos o Supremo Tribunal Federal de que a solução de pagarmos indenização dos presos será uma decisão paradoxal que não solucionará o problema, mas criará um novo problema, aumentando os custos operacionais do sistema prisional”

Com informações e entrevistas do repórter Daniel Lian

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