De Lula a Kadafi: José Sócrates e seu heterogêneo círculo de aliados

  • Por Agencia EFE
  • 23/11/2014 15h51

Antonio Torres del Cerro.

Lisboa, 23 nov (EFE).- Luiz Inácio Lula da Silva, Hugo Chávez, José Luis Rodríguez Zapatero e Muammar Kadafi são exemplos de líderes com os quais estreitou laços o ex-primeiro-ministro de Portugal, José Sócrates, que também se orgulhava de ter boas relações com grandes banqueiros e empresários de seu país.

Atualmente detido por suspeitas de crimes fiscais, o chefe de governo português entre 2005 e 2011 praticou durante seu mandato um tipo de audácia política e empresarial que o levou a entrar em países como Líbia e Venezuela.

O primeiro, comandado ainda por Muammar Kadafi, foi visitado por Sócrates em quatro ocasiões em seis anos.

O ex-primeiro-ministro conseguiu que o pequeno Portugal tivesse grande presença empresarial na Líbia, e que Trípoli fornecesse petróleo e gás a Lisboa.

“Temos que diversificar nossas exportações e a Líbia é um de nossos parceiros estratégicos”, declarou o dirigente socialista em 2008, quando suas efusivas saudações ao coronel Kadafi criaram bastante polêmica no país.

O fato de ser um regime censurado por alguns dos tradicionais aliados lusos, a maioria na União Europeia (UE), mas também pelos Estados Unidos, não assustou o tenaz Sócrates, que dedicou uma recepção em grande estilo ao extravagante dirigente líbio, falecido em 2011.

Em 2007, Kadafi compareceu à Cúpula UE-África que aconteceu em Lisboa acompanhado por um séquito de cerca de 200 pessoas que se alojaram em uma tenda nas instalações do Forte de São Julião da Barra, a residência oficial do Ministério de Defesa de Portugal.

Essa audácia política, para alguns temerária, lhe serviu também para estabelecer excelentes relações com o bolivariano Hugo Chávez, que qualificava Sócrates como “meu amigo”.

Os dois governantes se reuniram pelo menos em cinco ocasiões entre 2007 e 2011 nas quais fecharam vários acordos.

Um dos mais destacados daquela etapa foi a compra, por parte da Venezuela, dos minicomputadores portáteis portugueses Magalhães, destinados às escolas venezuelanas, em 2008.

Em troca de 128 milhões de euros, Caracas também chegou a encomendar a Portugal a construção de dois navios asfalteiros que, após anos paralisados, estarão terminados apenas em 2015.

Lisboa conseguiu ainda que a empresa lusa LENA vendesse a Caracas 50.000 casas sociais pré-fabricadas.

Casualidade ou não, um dos detidos na mesma operação que prendeu Sócrates é Carlos Santos Silva, ex-administrador de LENA e amigo íntimo do ex-governante socialista.

Com a Espanha de Zapatero (2004-2011) e o Brasil de Lula (2002-2010), Sócrates se aproximou incitado pelas afinidades ideológicas, sobretudo, com Zapatero.

Aproximar Portugal da Espanha foi um dos eixos do governo do ex-primeiro-ministro luso, fervente impulsor do trem de alta velocidade (AVE) entre Lisboa e Madri, que nunca deixou de ser um projeto devido à crise econômica.

Em qualquer caso, Sócrates, que sempre era visto ao lado de Zapatero nas cúpulas europeias, se empenhou em aprofundar as relações comerciais luso-espanholas.

Mas também ganhou opositores desta política “entre irmãos”, sobretudo entre os conservadores, que, em períodos de crise, criticaram duramente a dependência comercial portuguesa com a Espanha, seu melhor cliente.

Sócrates viu no pujante Brasil de Lula outro interessante parceiro de quem Portugal tinha se afastado, apesar de ambos países compartilharem língua e história.

Dizem que, em segredo, Sócrates promoveu o reingresso da Portugal Telecom no Brasil através da compra de 23% da Oi. A empresa lusa tinha deixado o país ao vender à Telefónica da Espanha os ativos que tinha na Vivo.

Em seu mandato, Sócrates se reuniu várias vezes com Lula, com quem assinou vários acordos em matéria de energia, imigração e educação, entre outros.

Sua amizade perdurou e o ex-presidente do Brasil foi, em outubro de 2013, um dos convidados de honra na apresentação do livro de Sócrates, resultado de sua tese em Paris.

O dirigente socialista sempre gostou de mostrar um perfil muito ativo internacionalmente, e não em vão seu país conseguiu organizar a Cúpula Europeia de 2007, a Cúpula Ibero-Americana de 2009 e a da Otan em 2010.

Mas José Sócrates também estendeu suas boas relações à classe empresarial.

Os melhores exemplos foram os líderes de duas companhias que também caíram em desgraça atualmente: Zeinal Bava, ex-presidente da Portugal Telecom, e Ricardo Salgado, líder do extinto Banco Espírito Santo e sobre o qual pesam suspeitas de graves delitos. EFE

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