Rohingyas, da segregação em Mianmar às redes de tráfico de pessoas

  • Por Agencia EFE
  • 22/05/2015 06h23

Gaspar Ruiz-Canela.

Hat Yai (Tailândia), 22 mai (EFE).- Segregados em campos sem liberdade nem recursos no oeste de Mianmar, milhares de pessoas da minoria muçulmana rohingya decidem embarcar em perigosas viagens e caem nas redes do tráfico de pessoas.

Não é só no Mar Mediterrâneo que imigrantes se amontoam em embarcações. Nas águas que banham o oeste do Sudeste Asiático, barcas cheias de bengaleses e rohingyas se encontram à deriva em condições deploráveis.

Cerca de 2.200 imigrantes conseguiram chegar a Indonésia, Malásia e Tailândia, mas os demais estão sendo rechaçados e empurrados a alto-mar sistematicamente pelos navios da marinha desses países, que se sentem sobrecarregados com a situação. Os que morrem por causa de debilidade ou por doenças são jogados ao mar.

Segundo a Organização Internacional de Migrações (OIM), até oito mil imigrantes ilegais estão em embarcações de traficantes de pessoas nas águas do Oceano Índico, de Bangladesh à Indonésia.

A maioria dos imigrantes bengaleses foge da pobreza extrema de Bangladesh, enquanto os rohingyas escapam da perseguição e da discriminação tanto em território nacional como em Mianmar, onde têm a cidadania negada.

Os rohingyas, que também não são reconhecidos em Bangladesh, têm liberdade de movimento restringida e precisam de permissões especiais até para casar ou ter filhos.

A situação dessa minoria muçulmana piorou em 2012, quando um surto de violência sectária no oeste birmanês causou dezenas de mortes e deixou mais de cem mil refugiados, a maioria rohingyas que tinham sido expulsos de suas casas por grupos de budistas.

O número de refugiados, com milhares de acampamentos instalados em campos cheios de poeira, chega atualmente a cerca de 140 mil no estado de Rakhine, antes chamado Arakan.

O desespero faz com que embarquem com traficantes em troca de centenas de dólares para tentar chegar à Malásia ou à Indonésia, onde esperam se juntar aos rohingyas que conseguiram trabalho e agora podem enviar dinheiro às famílias.

No entanto, muitos terminam sequestrados em alto-mar ou em acampamentos clandestinos na floresta da Tailândia, onde os traficantes exigem pagamentos de US$ 1 mil a US$ 2 mil para libertá-los, uma quantia exagerada para os pobres rohingyas.

“A Tailândia é a rota marítima mais curta e os traficantes precisam de um país para receber o pagamento do resgate”, explicou à Agência Efe Chris Lewa, representante da ONG Arakan Project.

Segundo Lewa, as embarcações interceptadas na Malásia são detidas e os ocupantes, incluindo a tripulação, presos em centros de detenção durante meses até que serem libertados com ajuda do Acnur. “Assim os traficantes não têm como receber o dinheiro”, comentou.

Os rohingyas Mohammed Alam e Mohammed Hashem acabaram em um campo clandestino em Songkhla, no sul da Tailândia, onde os traficantes exigiram a suas famílias 120 mil bat (R$ 10 mil).

Segundo o ativista birmanês Bo Min Aung, um tio das vítimas tentou pagar o resgate, mas foi enganado e a máfia assassinou os dois rohingyas no fim de abril.

Esse caso fez com que as autoridades tailandesas iniciassem uma operação em maio contra as redes de traficantes de pessoas no sul do país, o que provocou a debandada das máfias, que abandonaram a milhares de imigrantes nos acampamentos e em embarcações à deriva.

Organizações como Human Rights Watch e Anistia Internacional pediram aos países do Sudeste Asiático para que lidem com o problema como uma emergência humanitária e que Mianmar reconheça e melhore a situação da minoria rohingya.

Cerca de 800 mil membros dessa minoria vivem no oeste birmanês, enquanto aproximadamente um milhão se refugia em Bangladesh, Arábia Saudita, Paquistão, Tailândia e Malásia.

As autoridades birmanesas se negam a utilizar o termo “rohingya” porque os consideram imigrantes bengaleses, enquanto ativistas rohingyas afirmam que sua presença no país remete a mais de mil anos.

Em um estudo linguístico publicado em 1799, o britânico Francis Buchanan mencionou os “maometanos, que se estabeleceram em Arakan durante um longo período, e que se chamam Rooinga ou nativos de Arakan”.

No entanto, alguns acadêmicos birmaneses como Aye Chan defendem que o termo “rohingya” foi inventado nos anos 1950 por imigrantes bengaleses que começaram a chegar a Mianmar desde o século XIX. EFE

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