Será que Trump dá conta? Especialistas avaliam promessas de campanha

  • Por Marina Ogawa/Jovem Pan
  • 17/01/2017 13h55
EFE Donald Trump - EFE

Essa sexta-feira, 20 de janeiro de 2017, ficará marcada como o dia em que a Casa Branca receberá uma das figuras mais polêmicas que já assumiram o comando dos Estados Unidos: o republicano Donald Trump.

Entre as diversas promessas feitas pelo magnata, muitas delas caem por terra, já outras podem mesmo ser cumpridas durante seu mandato, segundo especialistas.

A Jovem Pan Online quis saber: o que Trump fará nestes casos? Vai cumprir com algumas de suas promessas? Ou não vai dar conta do recado? Vamos então por partes.

O 45º presidente dos EUA derrotou a opositora Hillary Clinton no início de novembro. Durante grande parte da sua campanha prometeu diversas coisas; entre elas estavam: construção de um muro na fronteira com o México, revogação do Obamacare, maior rigor no relacionamento com outras lideranças mundiais, investimento em infraestrutura e maior corte de impostos.

O polêmico muro

Trump prometeu a construção de um muro na fronteira com o México. “Não é uma cerca, é um muro”, garantiu o republicano, que ainda disse que é o México quem pagará pela construção.

O professor de Relações Internacionais da FAAP, Marcus Vinícius Freitas, acredita que a alegação do muro seja apenas uma recordação de que existe porosidade na fronteira, o que permite a passagem de imigrantes. “Quando ele fala de fronteira, nada mais é que a necessidade de um efetivo controle para evitar a entrada de estrangeiros pela fronteira seca”, diz.

O mesmo simbolismo é observado por Geraldo Zahran, professor do Departamento de Relações Internacionais da PUC-SP e coordenador do Observatório Políticos dos Estados Unidos. “Muros podem ser atravessados, mas é um posicionamento duro, principalmente em relação ao governo mexicano”, afirma.

(Uma pequena cerca separa a densamente povoada Tijuana, no México (à direita) de San Diego, nos Estados Unidos, no setor da Patrulha Fronteiriça. Foto: Sgt. 1st Class Gordon Hyde/Wikimedia Commons)

Vai dar conta? Os especialistas creem que Trump deve mesmo criar a barreira física, e acrescentam a isso um maior endurecimento nas políticas de deportação e de imigração. Para Freitas, Trump deverá estabelecer um maior controle da fronteira, bem como reforçar o policiamento e a utilização de tecnologia, além da política de deportação daqueles que forem pegos ilegalmente tentando ingressar no país.

Já Zahran pondera: “muitas das práticas são implantadas por funcionários de Estados e municípios. Existem municípios mais progressistas e que irão tentar impedir o endurecimento. Vamos aguardar para ver como isso vai dar”.

Obamacare

Assíduo no Twitter, o novo presidente afirmou há poucos dias que a reforma do sistema de saúde promovida por seu antecessor “em breve ficará na história”. O Obamacare é o programa de subsídios do governo para ajudar famílias a pagar um plano de saúde. Nos Estados Unidos, todo cidadão deve ter um plano de saúde – e estão sujeitos à multa caso não o possuam.

“Os republicanos querem há muito tempo derrubar o Obamacare, a dúvida é se viria algo no lugar”, diz Geraldo Zahran. Freitas atenta que o republicano deve colocar algo no lugar.

(Assinatura do presidente dos EUA Barack Obama na proposta de reforma denominada Obamacare. Foto: Chuck Kennedy/Official White House Photo)

Vai dar conta? Ambos os especialistas ouvidos pela reportagem acreditam que Donald Trump irá mesmo manter sua promessa e revogar o programa, e que o republicano colocará algo no lugar o quanto antes.

“Transição precisa ser muito bem pensada para evitar problemas com as pessoas que ficam sem plano de saúde. Se você repele e não coloca coisa no lugar, você cria um limbo em que as pessoas sem plano ficam desprotegidas. Ele disse que vai repelir e colocar uma legislação imediatamente no lugar”, diz Freitas.

“Vão cancelar normas do Obamacare, mas vai propor novas medidas. Haverá algo a ser colocado no lugar”, crê Zahran.

Acordo nuclear com o Irã

O republicano ameaçou acabar com o acordo que restringe o programa nuclear do Irã em troca da suspensão das sanções contra o país, ou ainda uma busca por um melhor acordo. No entanto, o Irã reafirmou que não irá renegociar e que o acordo está mantido.

A negociação do Irã com os EUA, França, Alemanha, Grã-Bretanha, Rússia e China levou a sanções por parte da ONU, sendo que o Irã ainda está sujeito a embargo de armas da organização e outras restrições – que não fazem parte, tecnicamente, do acordo nuclear.

(Presidente do Irã, Hasan Rohani, reafirmou nesta terça-feira, 17, que Irã não vai renegociar acordo nuclear com Donald Trump. Foto: EFE)

Vai dar conta? O coordenador do Observatório Político dos Estados Unidos diz que a revogação do acordo pode acontecer, mas esta decisão contrariaria os países que o mantêm. “Se os Estados Unidos cancelarem o acordo, vão se ver sozinhos. Não vão conseguir implementar sanções multilaterais que existiam antes. Ainda é incerto se ele vai mesmo fazer isso”, avalia Zahran.

Relação com a China

Em dezembro, o republicano iniciou uma crise diplomática com a China ao conversar com a presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, por telefone. Pequim considera a ilha de Taiwan como uma província separatista e que deve retornar ao seu controle, se preciso, pela força. A conversa do republicano com Ing-wen provocou reações chinesas, que criticaram a atitude do americano. Trump declarou estar disposto a questionar esse princípio, por considerar que “tudo é negociável, incluindo [o princípio] de uma só China”.

A China, no entanto, disse que é “um tiro no pé” a insistência de Trump em reforçar as relações entre Washington e Taiwan. Em resposta, Trump ameaça reagir duramente às práticas comerciais chinesas, que considera abusivas. 

(Presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, em coletiva de imprensa na última semana. Foto: EFE)

Vai dar conta? Para Geraldo Zahran, uma tentativa de renegociações ou de maiores imposições tarifárias serão recebidas com retaliações por parte do governo chinês. “Isso pode desencadear um conflito. A China é uma grande economia e existe dependência mútua entre China e Estados Unidos”, explica.

Relação com a Rússia

Segundo Trump, se a Rússia ajudar os EUA em objetivos específicos, como a luta contra o terrorismo, as sanções sobre o país podem ser revogadas. A erradicação do Estado Islâmico é uma das promessas do republicano – e que também pode melhorar sua imagem e a do poderio do país perante a comunidade internacional, segundo Marcus Vinícius Freitas.

(Grafite em mural na Lituânia mostra Donald Trump beijando Vladimir Putin. Foto: EFE)

Vai dar conta? A luta contra o terrorismo é, aparentemente, uma grande prioridade, não só para os EUA como para os países europeus. O republicano já prometeu que terá uma política mais pragmática com relação à Rússia, e que vai tentar negociar diretamente com o presidente Vladimir Putin.

Retomada do crescimento econômico

Durante sua campanha, o presidente dos EUA prometeu certo alívio fiscal aos cidadãos e empresas do país. Acordos internacionais, no entanto, poderão ser revistos. Segundo Geraldo Zahran, a lógica por trás do corte de impostos é deixar mais dinheiro na mão dos empresários, o que levaria a uma geração de empregos. Entretanto, um corte de impostos diminui a arrecadação do Estado e há uma tendência ao aumento do déficit público. “A não ser que o corte de arrecadação seja acompanhado do corte drástico das despesas, o déficit do governo vai aumentar”, explica.

Marcus Vinícius Freitas, em contrapartida, enxerga vantagem no corte de impostos: “muitos se preocupam com o déficit, mas de alguma forma, se acredita que com isso as empresas vão produzir mais nos Estados Unidos e, com isso, os preços dos produtos podem ser mais baratos, além de se empregar mão de obra”.

(Infraestrutura: déficit do governo pode aumentar se não vier acompanhado de corte de gastos. Foto: Carlos Severo/Fotos Públicas)

Vai dar conta? Trump muito tem falado sobre o investimento em infraestrutura, além do corte de impostos. Na parte da infraestrutura, no entanto, há uma contradição, segundo Zahran. “Ele vai tentar passar um grande pacote de infraestrutura para a construção de estradas, portos, ferrovias, e isso aumenta os gastos do governo. É uma proposta incoerente. A tendência é que o déficit público aumente”, avalia.

Já o professor da FAAP acredita que o investimento em infraestrutura pode gerar uma criação maior de empregos, mesmo com processos de automação. “Quanto mais você torna a sociedade automatizada, menor o número de empregos nos setores tradicionais da indústria. Então ele vai precisar treinar e readequar a mão de obra às novas necessidades da sociedade”, defende. 

Resta então aguardar a posse do republicano e verificar se ele irá ou não cumprir parte de suas promessas.

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