Nem sempre decorativos: entenda a importância dos vices na política

  • Por Marina Ogawa/Jovem Pan
  • 25/04/2016 21h51
Montagem/Presidência da República Vice-presidentes que assumiram o poder (Montagem: Presidência da República)

Você sabe em quais candidatos votou na última eleição presidencial? Ainda mais, lembra quem eram os seus vices? Ao votar, você levou em consideração a chapa como um todo? Apesar de básico, é recorrente deixarmos o aspecto do vice (seja ele presidente, governador ou prefeito) em segundo plano.

Nesta semana assistimos ao afastamento de Dilma Rousseff pelo Congresso. Em seu lugar, o então vice-presidente Michel Temer comandará o País por até 180 dias, ou enquanto durar o julgamento da presidente. Definitivamente, é um fato marcante para a história brasileira, mas não é tão incomum como se imagina. “Não é o esperado. O esperado é que o presidente conclua seu mandato”, afirma a cientista política da Unicamp, Andrea Freitas.

De acordo com o cientista político Humberto Dantas, é preciso lembrar que o vice, de acordo com a Constituição, tem um cargo. “Ele assume o poder como vice-presidente da República. Os vices assumem um mandato. Eles têm um gabinete, rotina, responsabilidades. A mais fundamental destas responsabilidades é estar à disposição do prefeito, do governador ou do presidente para assumirem o poder sempre que forem chamados”, destaca.

A urna eletrônica é uma prova cabal disso. Todo material de campanha, por lei, agrega o nome do vice. “Dizer que as pessoas não votaram em Michel Temer, mas só em Dilma Rousseff, é um atentado contra a lógica eleitoral”, aponta Dantas. Resumindo: Temer foi eleito democraticamente assim como foi a presidente Dilma e, por isso, é seu dever assumir o cargo. 

Dilma Rousseff e vice-presidente Michel Temer durante a Cerimônia de Posse (Foto: Instituto Lula)

“A gente tem a mais absoluta e plena sensação de que Temer manobrou fortemente nos bastidores da política para tomar o lugar de Dilma, mas é indiscutível que ele foi eleito junto com a presidente e que quem apertou 13 na urna no último domingo de outubro de 2014, também apertou 15, porque o 15 e o 13 estavam conjugados”, completa Dantas.

Qual a consequência de um vice assumir?

Quando vamos às urnas eleger nossos representantes, é normal não esperarmos que o vice venha a assumir e, por isso, a passagem de poder do titular para o vice vem sempre de um processo razoavelmente traumático.

“É o papel do vice assumir em caso de vacância do cargo. Não sei quanto os eleitores em geral levam em consideração a possibilidade real de que aconteça algo que impeça o titular de permanecer no cargo. Mas essa passagem do titular para o vice é sempre algo estressante”, diz a cientista da Unicamp Andrea Freitas

Para Humberto Dantas, o aspecto das carreiras políticas também pode influenciar nessa “passagem de bastão”. “Os políticos abandonam os postos para os quais foram eleitos simplesmente porque querem dar sequência às suas carreiras políticas”, diz.

Foram os casos de José Serra e Geraldo Alckmin. Ambos deixaram seus postos para pleitearem o cargo de chefe de Estado. Alckmin renunciou ao governo paulista para ser candidato à Presidência em 2006. Quatro anos mais tarde, José Serra também deixou seu cargo de governador do Estado de São Paulo em 2010 para disputar a Presidência.

Governador de SP, Geraldo Alckmin, e senador José Serra. (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

Eleições separadas: alternativa para casos de alternância de poder?

No período de 1946 a 1964, a eleição era realizada separadamente. Se por um lado isso garantia maior legitimidade à vice-presidência – a medida em que também recebe votos ligados diretamente -, por outro lado você pode ter casos em que o presidente viaja ao exterior e o vice, ao assumir, faz coisas que o presidente não gostaria que fossem feitas. Em 1961, por exemplo, Jânio Quadros e João Goulart foram eleitos separadamente. “Eles eram de grupos políticos diferentes. Foram eleitos e cumpriram mandatos distintos”, relembra Humberto Dantas.

Jânio Quadros e João Goulart. (Foto: Presidência da República)

Para os especialistas, no entanto, não há a necessidade de uma votação separada no modelo atual.

“Acho que isso é um elemento conflitivo no sistema político. Não tem a menor necessidade de você eleger separadamente vice e presidente. Você cria um elemento a mais de estresse no sistema político, que já é muito fragmentado”, pontua Freitas.

Para Dantas, uma eleição separada para presidência e vice-presidência “não teria o menor sentido”. “Se quando elege junto já briga, imagina quando elege separado. Seria um retrocesso. Não vejo sentido para a gente empreender um recurso gigantesco em termos de uma reforma constitucional para chegar neste tipo de resultado. Acho que o Brasil não precisa disso”.

Confira os vices que assumiram a Presidência na história do Brasil

– Floriano Peixoto: gestão de Marechal Deodoro da Fonseca

Assumiu no dia 23 de novembro de 1891 após a renúncia do titular, que dependia das Forças Armadas para governar. Governou até 15 de novembro de 1894.

– Afonso Pena: gestão de Rodrigues Alves

Governador de Minas Gerais, Afonso Pena chegou à vice-presidência sendo vice do então vice de Rodrigues Alves, Francisco Silviano de Almeida Brandão, que morreu antes da posse. Afonso Pena foi presidente de 15 de novembro de 1906 a 14 de junho de 1909, quando tambem morreu.

– Nilo Peçanha: gestão de Afonso Pena

Afonso Pena faleceu em 14 de junho de 1909 e Nilo Peçanha, seu vice, assumiu o mandato da presidência até 15 de novembro de 1910.

– Delfim Moreira: gestão de Rodrigues Alves (segundo mandato)

Delfim Moreira assumiu no dia 15 de novembro de 1918, por conta de problemas de saúde de Alves que, em 16 de janeiro de 1919, morreu em decorrência da gripe espanhola. Delfim Moreira permaneceu no cargo até que fossem convocadas novas eleições.

– Café Filho: gestão de Getúlio Vargas

Assumiu em 24 de agosto de 1954 após o suicídio do presidente. Ficou no cargo até 08 de novembro de 1955, quando renunciou.

– João Goulart: gestão de Jânio Quadros

Jânio Quadros renunciou em 25 de agosto de 1961, para Jango assumir. João Goulart permaneceu no cargo até 1º de abril de 1964, quando foi deposto pelo Golpe Militar.

– José Sarney: gestão de Tancredo Neves

Sarney assumiu interinamente a presidência em 15 de março de 1985. Tancredo Neves morreu em 21 de abril do mesmo ano e José Sarney permaneceu no cargo até 15 de março de 1990.

– Itamar Franco: gestão de Fernando Collor de Mello

Assumiu interinamente em 02 de outubro de 1992 e foi formalmente aclamado em 29 de dezembro de 1992, logo após a renúncia de Collor por conta do processo de impeachment. Governou até o dia 1º de janeiro de 1995

(Fotos presidentes: Presidência da República)

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