Ordem de prisão de Lula é ato de “despotismo judicial”, diz Gilmar Mendes

  • Por Estadão Conteúdo
  • 06/04/2018 14h53
EFE/Joédson Alves EFE/Joédson Alves "Estamos vivendo uma Prokuratura", afirmou o ministro, utilizando o termo russo que se refere ao período que a então União Soviética vivia sob a subordinação do poder legislativo soviético
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes avaliou nesta sexta-feira (6), ao Broadcast, que a ordem de prisão do juiz Sérgio Moro ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é “absurda”, porque ainda não foram finalizados todos os procedimentos do Tribunal. Ele classificou a situação atual no País como “despotismo judicial”.

“Estamos vivendo uma Prokuratura”, disse há pouco em entrevista ao Broadcast, realizada em Lisboa. O termo russo refere-se ao período que a então União Soviética (URSS) vivia sob a subordinação do “Soviete Supremo”, o poder legislativo soviético.

O ministro voltou a dizer que a situação no Brasil e no próprio STF está muito confusa. “Esta foi uma crise embrenhada, mal gerida pelo Supremo”, avaliou na capital portuguesa, onde participou de uma série de eventos da área jurídica. “A única coisa que me conforta nisso tudo é que toda essa crise que estamos vivendo é fruto de uma desinstitucionalização criada pelo PT”, declarou.

O ex-presidente Lula, conforme o ministro, está sendo vítima de sua própria obra, ao ter feito, entre outros coisas, más indicações para o Supremo. “Foram péssimas indicações para o Supremo. Pessoas que não eram conhecidas foram indicadas, não tinham formação, não tinham pedigree. Eram para preencher vagas como de simpatizantes do MST, de causas, de grupo afro, sem respeitar a institucionalização do País, por ser amigo de algum político”, enumerou.

Para o ministro, personagens como Sérgio Moro e Deltan Dallagnol são “filhos de um cruzamento do PT com Luiz Francisco” Fernandes de Souza, procurador da República. “Eles armaram isso tudo. Criaram uma desinstitucionalização. O aparelho que hoje existe, o mecanismo ou coisa do tipo, é este: delegado procurador, juiz. . São essas ações articuladas e o Estado de Direito ameaçado”, pontuou.

Perguntado sobre se mudar de voto no caso do habeas corpus do presidente Lula também não poderia ser avaliado como uma forma de fazer parte do “mecanismo”, ele disse que a sua alteração não teve importância. “Minha posição todos conhecem há muitos anos e tudo é fundamentado. Trouxe para o plenário a rediscussão sobre a necessidade de ter limites. Continuo a achar isso, não é possível simplesmente esperar o trânsito em julgado, porque isso não existe mais na prática”, argumentou.

Mendes, conhecido por suas declarações fortes, avaliou que o País passa hoje por um “voluntarismo sem precedentes”. “Acho um absurdo essa ordem de prisão dada assim, sem sequer se exaurirem os procedimentos do tribunal. Não está publicada a decisão. A única coisa que me conforta a alma é que o PT, o que é muito raro, está pagando.”

O ministro citou a frase do Victor Nunes Leal: “Tal é o poder da lei que a sua elaboração reclama precauções severíssimas. Quem faz a lei é como se estivesse acondicionando materiais explosivos. As consequências da imprevisão e da imperícia não serão tão espetaculares, e quase sempre só de modo indireto atingirão o manipulador, mas podem”.

Para ele, neste caso, porém, o PT, apontado como o articulador dos “materiais explosivos”, acabou também sendo uma vítima. “Isso é raro. Em geral, o legislador que faz as trapalhadas não é atingido pela explosão. Mas agora foi.”

Ao falar sobre sua avaliação de que a ordem de prisão de Moro trata-se de um ato de despotismo judicial, ele disse que o País passa por uma onda de autoritarismo penal que varre o País. “Isso tem que ser denunciado e cobrado”, disse.

Questionado sobre se Moro poderia sofrer algum tipo de punição, no entanto, disse que não discutiria o assunto. “Só digo que é fruto de uma má… essa mixórdia que se fez”, disse, usando um termo bastante lusitano que significa o mesmo que bagunça.

Mendes reforçou que o Partido dos Trabalhadores deixou como “notório legado” uma Corte institucional mal formada, mal indicada, com ministros, de acordo com ele, sem perfil, sem compromisso histórico, sem conhecimento da máquina. “Daí gera essa bagunça que está aí. Fizemos um experimentalismo maluco e o resultado está aí”, afirmou, criticando mais uma vez a condução da pauta da ministra Carmen Lucia no caso do julgamento do HC de Lula. Para Mendes, os ADCs deveriam ser analisados na mesma ocasião.

“Fico com vergonha de estar vivendo um momento de totalitarismo policial, judicial. Esse decreto da prisão do Lula representa isso. Meu consolo é que isso é fruto das maquinações do PT, da intenção de venezuelar o Brasil”, voltou a criticar.

Na avaliação do ministro, o risco de o Exército tomar conta do governo é bem menor hoje do que o de outras áreas da sociedade. “Na verdade, não é o Exército. Quem tem ameaçado o governo são os promotores, os juízes, são nomeações como a da Cristiane Brasil, não é o exército. Trata-se de um governo fraco que vem enfrentando abusos. A Corte não está à altura do Brasil, finalizou.

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