Um pequeno recuo do abismo na Venezuela

  • Por Caio Blinder/Jovem Pan Nova Iorque
  • 10/07/2017 07h27 - Atualizado em 10/07/2017 09h45
EFE/MIGUEL GUTIÉRREZ Opositor venezuelano Leopoldo López acena desde sua casa, na prisão domiciliar, para seguidores em Caracas

Mesmo ditaduras truculentas, burras e que arrogam sua solidez recuam quando estão à beira do abismo. A Venezuela desgovernada por Nicolás Maduro fez um recuo até que inteligente, para os seus padrões, ao transferir Leopoldo López para a prisão domiciliar, alegando razões de saúde e irregularidades no seu julgamento. Ele ficou no cárcere 3 anos e 5 meses.

López, o mais importante e carismático preso político da Venezuela (sim, ele continua sendo preso político), foi condenado a 14 anos de prisão por instigar a violência, em uma farsa judicial. A última coisa que Maduro gostaria agora é que ele morresse na prisão e se transformasse em mártir.


Aliás, a China, uma ditadura muito pior do que a venezuelana, na semana passada, transferiu Liu Xiaobo da prisão para um hospital para que o Prêmio Nobel da Paz e mais importante dissidente do país não morresse no cárcere, pois está com câncer de fígado terminal.

A situação da Venezuela é diferente da chinesa. O povo está nas ruas protestando há 100 dias consecutivos, num saldo sangrento, e existem divisões dentro do próprio regime como proceder agora que Nicolás Maduro convocou uma obscena Assembleia Constituinte no passo final para transformar a Venezuela numa ditadura escancarada e provavelmente provocar uma guerra civil.

É um caminho perigoso, tanto para o regime, como para a oposição. A mudança do status carcerário de Leopoldo López é um desdobramento que abre novas possibilidades. De um lado, pode apaziguar algumas alas do regime, com a dissidência liderada pela procuradora-geral da República, Luisa Ortega, que se insurgiu contra os excessos. Eu duvido que isso possa cicatrizar as feridas dentro do chavismo.

Do outro lado, a decisão do governo Maduro confunde a oposição e aqui o desfecho pode ser mais inquietante. Nunca foi fácil costurar uma ampla coalizão contra o regime que engloba partidos e movimentos que vão da centro-esquerda a uma direita mais conservadora.

O fotogênico Leopoldo López e sua também fotogênica e infatigável mulher Lilian Tintori pertencem a um partido mais conservador e intransigente, Voluntad Popular, sobre como lidar com o regime. No entanto, López na prisão conversava com altas autoridades do regime e disse que no poder a oposição não será revanchista contra o chavismo.

Este novo capítulo de sua saga, a prisão domiciliar, tem dois efeitos imediatos: o regime sinaliza que a saúde de López deixou de ser sua responsabilidade (e mesmo sua segurança pessoal), mas também é um tremendo desafio para a oposição não rachar. A primeira reação da oposição foi boa. Já no domingo redobrou a mobilização, exigindo a libertação de todos os presos políticos.

Mas, como eu disse, até Nicolás Maduro é capaz de um arroubo de inteligência.

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