Com tantos escândalos, leitor brasileiro sofre bem mais que sueco ou dinamarquês

  • Por Reinaldo Azevedo/Jovem Pan
  • 14/04/2015 15h46
Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil O ministro da Saúde

Reinaldo, quer dizer que o nosso leitor, o leitor brasileiro, sofre mais que o leitor sueco ou dinamarquês?

Bem mais. Coitado do leitor brasileiro, seja ele de jornal, revista, internauta, pouco importa! Não é fácil acompanhar a pauleira, né? Imaginem como deve ser na Suécia ou na Dinamarca. Os caras acordam, tomam ciência do noticiário — alguma questiúncula envolvendo um benefício do estado de bem-estar social, ou, sei lá, ações humanitárias em lugares remotos do planeta — e vão cuidar de suas vidas. Uma boa ocupação é reclamar da qualidade do arenque. Sobrando um tempinho, leiam “A Morte de um Apicultor”, do sueco Lars Gustafsson. Alguns podem ser tentados a ver na obra certo mal-estar da abastança. Ainda acho que é melhor morrer de tédio do que de susto, de bala ou vício. Adiante. Por que eu me compadecia do leitor e agora do ouvinte, ou do internauta? A quantidade de escândalos que é obrigado a acompanhar chega a ser cruel. Pior: as autoridades já não temem mais o cinismo.

O ex-deputado André Vargas foi preso. O motivo desta feita foi a descoberta de que empresas ligadas a ele recebiam uma parcela dos contratos que a agência de publicidade Borghi/Lowe mantinha com a Caixa Econômica Federal e com o Ministério da Saúde. Os descontos oferecidos pelos órgãos de comunicação para veicular as propagandas — bonificação por volume — não eram revertidos nem em benefício dos entes estatais (uma possibilidade) nem da própria agência — que é a prática corriqueira no mercado. Iam parar, segundo a Polícia Federal, nas tais empresas ligadas a André Vargas e a seu irmão, Leon.

A Caixa Econômica anunciou que suspendeu os contratos e disse ter aberto uma sindicância interna. Já o Ministério da Saúde… Bem, o ministro Arthur Chioro, o petista que sucedeu Alexandre Padilha no cargo, limitou-se a dizer que a Borghi/Lowe foi contratada segundo procedimento regular, porque ofereceu o menor preço. Entre 2011 e 2014, a agência recebeu do ministério R$ 123,7 milhões. Parte desse dinheiro — R$ 2,6 milhões — foi parar em quatro empresas (Zulu, Sagaz, Luiz Portela e E-noise) e, de lá, migrou para os irmãos Vargas.

Sabem o que disse o ministro? Que a sua pasta não tem nada com isso. “Se houve irregularidades, ele disse, foi de privado para privado.” Entenderam? Para o titular da Saúde, o contrato com a sua pasta é regular, e os serviços foram prestados. Mas por que diabos, afinal, uma agência como a Borghi/Lowe subcontrataria produtoras que repassariam grana a Vargas, que publicitário não é? Chioro dá de ombros, como se o pulo do gato não estivesse justamente em mascarar o pagamento de propina por meio de um serviço aparentemente legal.

O ministro estava num dia realmente inspirado. Segundo o doleiro Alberto Youssef, ele próprio manteve um encontro com Alexandre Padilha e André Vargas para tratar da contratação do laboratório Labogen pelo Ministério da Saúde. O Labogen, vocês devem se lembrar, era uma das lavanderias a que recorria Youssef. Quem intermediou o negócio com a empresa de fachada foi Vargas, o mesmo que recebia uma porcentagem dos contratos de publicidade da pasta, durante a gestão… Padilha!

O que tem Chioro com isso? Segundo ele, nada também. Limitou-se a dizer que não há registro do encontro no ministério e decretou que o Labogen é uma página virada. Disse ainda que não há o que investigar no âmbito de sua pasta. Entenderam?

Pois é… Como são infelizes os suecos e dinamarqueses, que não contam com a criatividade, o desassombro e o cinismo de homens públicos como André Vargas, Alexandre Padilha e Arthur Chioro. Houvesse por lá políticos dessa qualidade, nunca mais reclamariam do preço do arenque. Nem escreveriam um livro como “A Morte de um Apicultor”.

Foto do Texto: Deputado André Vargas (ex-PT) ergue o punho contra Joaquim Barbosa no ano passado

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