Hora do decoro. Assim não, Rodrigo Maia! Assim não, Geddel! Ou: Temer, dê um murro na mesa!

  • Por Reinaldo Azevedo/Jovem Pan
  • 22/09/2016 07h51
Brasília - O ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, participa da Conferência Nacional de Defesa Civil e Assistência Humanitária Valter Campanato/ Agência Brasil (23/03/2010) Geddel Vieira Lima

Estou com saudade de uma palavra antiga. Sim, eu tenho saudade de palavras antigas. Uma delas é “decoro”. O decoro não é só uma etiqueta. O decoro é um recato. O decoro não é só um convencionalismo. Ele designa o acatamento de normais morais. A palavra era empregada pelos latinos na análise da obra de arte: esta era decorosa quando o conteúdo se adequava ao estilo. A arte pode e deve ser transgressiva, mas há que ser decorosa. Volto ao ponto.

Estou muito cansado da falta de decoro dos homens públicos. E refiro-me ao “decoro”, claro!, no sentido em que o emprego aqui. Querem ver? Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, recorreu ao Facebook para negar que tivesse algo a ver com aquela patuscada que resultaria na anistia dos políticos flagrados praticando caixa dois.

Como? Facebook? Quer dizer que as tramoias se dão no mundo real, mas as negativas se fazem no mundo virtual? Não serei eu a dizer aqui que Rodrigo Maia sabia qual era a pauta da Câmara, assim como não posso jurar que Lula sempre soubesse de tudo, mas posso perguntar em dois casos, tão desiguais em si: como não saber?

No Facebook, Maia disse também que pretende votar todo o pacote proposto pelo Ministério Público Federal contra a corrupção. Não sei o que quis dizer com isso. Há lá coisas boas e ruins. Transformar caixa dois em crime é uma medida boa. Fazer um teste aleatório de honestidade é coisa de regimes fascistas.

Geddel Vieira Lima
Outro que causou uma saia-justa desnecessária ao presidente Michel Temer foi o ministro Geddel Vieira Lima, da Secretaria de Governo. Em entrevista ao Globo, disse o doutor: “Quem foi beneficiado no passado, quando [caixa dois] não era crime, não pode ser penalizado. Esse debate tem de ser feito sem medo, sem preconceito, sem patrulha e sem histeria”.

A histeria, com efeito, é sempre má conselheira. Mas o truque retórico também. Pela ordem:
1: não há a menor possibilidade de uma lei retroagir para punir quem quer que seja. Logo, não seria nesse caso;
2: afirmar que caixa dois não é crime é, quando menos, controverso. Mas nem entro nesse mérito;
3: digamos que caixa dois passe a ser crime, isso não quer dizer que uma pessoa que faça caixa dois com um dinheiro que saiba de origem ilegal ou fruto da corrupção não possa incorrer em outros tipos penais;
4: já que a lei não retroage, ao se falar em anistia, o que se defende, na prática, é impunidade.

Confrontado com a opinião de seu ministro, disse Temer em Nova York: “Isso foi surpreendente para mim. Quando eu chegar lá no Brasil, vou examinar esta questão. Pessoalmente, não vejo razão para prosseguir ou prosperar nesta matéria”.

O presidente reiterou que a decisão, qualquer que seja ela, é do Congresso e que o governo não tem orientação nenhuma a respeito.

Murro na mesa
Já recomendei uma vez, e o faço de novo, o que vai a seguir. Ministros são o braço, ou a cabeça, do presidente em suas respectivas áreas. Geddel disse ter falado em nome pessoal, não do governo. Uma ova! Isso não existe na vida pública.

Ministro é ministro cem por cento do tempo. Por isso, tem segurança cem por cento do tempo. Por isso tem residência oficial cem por cento do tempo. Por isso dispõe de ampla estrutura cem por cento do tempo. Ministros e ministras são ministros e ministras até na cama. Um adultério, para usar um exemplo extremo, é matéria importante quando se é uma das extensões do chefe do Executivo.

Como ninguém é obrigado a exercer tal cargo, só o faz se quiser; a alternativa é escolher outro rumo. Temer deveria dar um murro na mesa: “Quando os senhores estiverem dando uma entrevista, é como se fossem eu. Quem falar algo que não seja uma diretriz de governo está na rua”.

É assim que as coisas têm de funcionar. É só assim que elas funcionam.

Se Geddel quer fazer especulações filosóficas e retóricas sobre os caminhos da moralidade pública e a histeria, que o faça. Mas longe do governo.

Eu faço. E muito! Posso até concordar com Geddel em alguns aspectos. Mas eu não sou poder.

Aliás, a  minha melhor contribuição ao governo é ser seu crítico, não seu puxa-saco. Isso seria coisa de petralhismo às avessas. E eu sou contra petralhas. Não só porque são quem são. Eu também sou contra seus métodos.

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