Editorial – Nem Moro esmagou Lula nem o inverso. Mas só um feriu a lei ontem

  • Por Reinaldo Azevedo/ Jovem Pan
  • 10/05/2017 18h27
BRA100. CURITIBA (BRASIL), 10/05/2017.- El expresidente brasileño Luiz Inácio Lula da Silva participa hoy, miércoles 10 de mayo de 2017, en un evento con miles de simpatizantes, en la plaza Santos Andrade, en Curitiba (Brasil), tras declarar como imputado por corrupción. "Estoy vivo y preparándome para volver a ser candidato a la Presidencia de la República", afirmó. Lula prestó declaración durante cinco horas ante el juez Sergio Moro en los juzgados federales de Curitiba por la supuesta propiedad de un apartamento en el balneario paulista de Guarujá que figura en los registros a nombre de la constructora OAS. EFE/FERNANDO BIZERRA JR EFE/Fernando Bizerra Jr. Ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva discursa após depor a Sergio Moro em Curitiba

Os dias andam agitados demais. Coisas em excesso, demandas as mais variadas. Mas vamos lá. É claro que eu iria, como faço agora, escrever um texto com a minha avaliação sobre o depoimento prestado pelo ex-presidente Lula ao juiz Sergio Moro, em Curitiba.

A minha síntese? Pois não! Sem poder apresentar as provas, que deveriam ter sido fornecidas pelo Ministério Público Federal, de que o tríplex pertence a Lula, Moro optou por uma condução da audiência que fez picadinho do devido processo legal.

Acho que o apartamento é de Lula? Acho. Mas não sou juiz. E o meu achar é irrelevante. No estado de direito, condena-se com provas. E Moro não as tinha. Ao contrário, as evidências materiais apontam que o imóvel pertence à OAS.

Sem ter como dar o xeque-mate ou deixar o depoente numa sinuca, Moro optou por um comportamento lamentável, que agride o devido processo legal. Resolveu fazer perguntas a Lula que diziam respeito aos quatro outros inquéritos a que o petista responde.

Entre as perguntas impróprias, a maioria buscava demonstrar que o petista, afinal, era o verdadeiro chefe da estrutura criminosa que operava na Petrobras.

Observem: no inquérito em questão, há três contratos da OAS com a estatal sob suspeita; eles teriam gerado a propina que o MPF diz ter sido paga a Lula na forma do apartamento de Guarujá e do transporte e armazenamento de seu acervo. Não! Moro não se referiu a nenhum deles em particular.

Na verdade, ele tratava Lula como o chefe da organização criminosa. Ora, posso até concordar com isso. Mas esse é o inquérito que tramita no Supremo.

Mais: o juiz insistiu em fazer indagações sobre o sítio — afinal, as obras nesse imóvel e no apartamento estariam ligadas. Tudo indica que estão mesmo. Mas por que há, então, um inquérito para cuidar de cada caso? Por que não estão juntos?

Mais: o juiz demonstrou incômodo com a liderança política de Lula, o que é um despropósito. Quis saber por que o ex-mandatário emitiu juízos contraditórios sobre o… mensalão!!! O que a dita Ação Penal 470 tinha a ver com o apartamento de Guarujá? Nada!

Teve o desplante de dizer, ainda que o tenha feito de forma interrogativa, que o depoente, ao processar um delegado, um procurador e um juiz (sim, ele próprio: Moro!), estava tentando intimidar as pessoas encarregadas da investigação.

Trata-se de uma afirmação absurda. Apresentar petições ao poder público — e isso inclui recorrer à Justiça — é um direito fundamental das democracias. Vejam a Primeira Emenda da Constituição Americana, por exemplo.

Na era da pós-verdade e das verdades alternativas, versões se espalham na cloaca do capeta: as redes sociais. Petistas dizem que seu líder esmagou Moro. Os fanáticos do juiz sustentam o contrário.

Vamos botar os pingos nos is. Lula não esmagou ninguém. Deu-se mal, por exemplo, ao explicar suas relações com Renato Duque, ex-diretor da Petrobras, e deste com João Vaccari, tesoureiro do PT. E digo que se deu mal porque se atrapalhou.

Sergio Moro esmagou, sim, o devido processo legal, mas não o petista, que não foi confrontado com nenhuma prova inequívoca.  Mais: nós o vimos obrigando-se a dizer que nada tem de pessoal contra o presidente e de que nunca foi verdadeira a máxima “Lula vai ser preso amanhã”.

Ao tentar explicar por que fazia perguntas que nada tinha a ver com o processo, o juiz apelou, mais de uma vez, ao “contexto”. Não pode ser. A ser assim, a gente precisa ensinar o teorema de Pitágoras a partir do Big Bang. Já recomendava o poeta latino Horácio: não conte em seu poema a origem das musas…

Moro vai condenar Lula? A sua condução da audiência indica que sim. Se nada de novo aparecer, vai fazê-lo com base na convicção formada a partir do depoimento de delatores, sem as provas. É claro que isso é um mau exemplo.

Reação posterior de um procurador que é estrela da Lava Jato, Carlos Fernando dos Santos, evidencia que a própria Lava Jato avalia que Lula venceu o embate também no tribunal. Na ocupação das ruas, já havia vencido.

A Lava Jato, com o apoio entusiasmado da direita xucra, está, acreditem, cometendo erros em penca. E isso tem seu preço: fortalecimento da esquerda.

Sim, eu considero que Lula era o chefe máximo de um monstrengo criado para assaltar os cofres e a institucionalidade. Acho que tem de ser investigado, processado, julgado e condenado por isso.

Mas que as coisas se façam segundo o devido processo legal. Não darei nem a Moro nem a ninguém a prerrogativa de se comportar e de decidir ao arrepio da lei.

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