Retirada dos corpos foi a pior parte, lembra juiz que mediou rebelião no AM

  • Por Jovem Pan
  • 16/01/2017 06h18
Agência EFE Rebelião em presídio de Manaus - EFE

Em meio ao recesso judiciário, o juiz Luís Carlos Honório de Valois Coelho não era o plantonista designado para cuidar das atribuições da Vara de Execuções Penais de Manaus no dia primeiro de janeiro.

No entanto, depois de ser procurado insistentemente, com direito a uma ligação do próprio secretário de Segurança do Amazonas, ele se deu conta de que a situação realmente era muito séria.

O magistrado foi convocado para mediar a rebelião e interceder para a liberação de reféns que estavam cativos no Complexo Penitenciário Anísio Jobim, o Compaj.

Com o motim encerrado, as autoridades puderam perceber o tamanho do desastre. O juiz Valois então testemunhou cenas das quais ele não vai se esquecer. “E a tirada dos corpos que foi a pior parte, os presos tiraram os corpos e colocaram na frente da penitenciária. Só de falar isso já me deixa tenso”, lembrou.

Luís Carlos Valois lida com o dia a dia do sistema penitenciário amazonense e, por causa disso, pode falar com certa propriedade de como se estabeleceram as relações mortais entre os bandos criminosos.

O juiz afirmou que as transferências de lideranças de facções do sudeste do Brasil para presídios federais abriram caminho para que o modelo atingisse Estados do Norte e Nordeste. “Isso começou com a criação do sistema penitenciário federal. Líder de pavilhão sempre existiu. Esses líderes começaram a causar problemas para os Estados e os secretários mandavam para o sistema federal. E quando voltavam, voltavam com status elevado”, contou.

Luís Carlos Valois negou qualquer envolvimento com facções criminosas, disse que apenas trata os presos com respeito e por isso tem a consideração deles.

No norte do País, o poder financeiro passa pelo tráfico de drogas. E para o juiz, o enfrentamento a esse tema e aos outros da área da segurança pública são muito ruins. “A questão das drogas é um problema. Polícia faz blitz e não investiga mais assaltos e homicídios. Essa criminalidade comum já está abandonada”, lamentou.

Com mais um Plano Nacional de Segurança Pública anunciado e reuniões agendadas para colocá-lo em andamento, o juiz acredita que ele até possa fazer diferença.

Mas Luís Carlos Valois ressaltou que isso só pode acontecer com investimento de verdade e uma mudança de mentalidade sobre como se prende no Brasil. “O que precisa é de investimento. Se o que o ministro falou com relação a investimento for verdade, tem que investir. É o caminho”, disse.

Para Luís Carlos Valois, o Judiciário também é muitas vezes insensível ao problema no olhar para as políticas prisionais. “O próprio juiz tem um pensamento de que a prisão resolve alguma coisa. Ele não pensa no social, se aquela pessoa furtou lata de leite, bicicleta, se poderia responder em liberdade”, disse.

Apesar de tudo, Luís Carlos Valois disse que é feliz com o que faz, mas como ouvimos, reconhece uma série de percalços no caminho.

*Informações do repórter Tiago Muniz

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