Em 1999, Corinthians enfrentou o Olimpia e Guerra Civil no Paraguai na Libertadores

  • Por Jovem Pan
  • 22/03/2016 18h38
Montagem sobre Reprodução/Youtube e Instagram Vampeta marcou um dos gols da vitória corintiana; Lino Oviedo foi acusado de cúmplice em assassinato

O Corinthians viajou no começo do mês de março para o Paraguai, onde enfrentou, pela atual edição da Libertadores, o Cerro Porteño. Dezessete anos atrás, o clube também visitou o país vizinho pelo torneio continental, mas em uma situação bem diferente da atual. No dia 26 de março de 1999, o Timão foi ao Paraguai para enfrentar o Olimpia, pela fase de grupos, mas o clima político do país fez com que o jogo ficasse em segundo plano e proporcionou aos jogadores alvinegros uma experiência nunca antes vivida.

Naquele ano, o país sul-americano viveu uma das maiores crises políticas de sua história, que envolveu a morte do vice-presidente do país na época, acusações sobre o presidente e seu aliado político, além de sete manifestantes mortos em meio a protestos que deixaram o país efervescente. Em meio ao caos que tomava conta principalmente da capital Assunção, o clube brasileiro, que sonhava em conquistar a América pela primeira vez, encontrou mais do que um adversário dentro de campo.

O Timão em meio ao caos

Na manhã do dia 23 de março, três dias antes da partida, o então vice-presidente paraguaio Luis Maria Argaña foi assassinado. O crime foi diretamente ligado ao presidente da república, Raúl Cubas, e seu aliado político Lino Oviedo, causando indignação na população, que foi às ruas pedir o impeachment de Cubas e a prisão de Oviedo. A revolta ficou conhecida como “Março Paraguaio”.

Enquanto o Paraguai vivia o sério risco de entrar em guerra civil, o elenco do Corinthians desembarcava no país para enfrentar o Olimpia. O Timão chegou a Assunção com duas vitórias e duas derrotas em seu grupo que tinha ainda Palmeiras e Cerro Porteño. A vitória no estádio Defensores Del Chaco era fundamental para as pretensões alvinegras de conquistar o título sul-americano.

“Estávamos nos preparando para o jogo, não sabíamos da crise política que havia no país. Eu lembro que nós ganhamos de 2 a 1, e o público começava a gritar: ‘el pueblo, unido, jamás será vencido’”, lembrou Vampeta, volante do alvinegro à época e hoje comentarista da Rádio Jovem Pan. Se os jogadores não sabiam o que os cercava antes de entrar em campo no estádio Defensores del Chaco, depois a situação ficou mais clara.

“Quando voltamos para o hotel, vimos tanque de guerra na rua, polícia pra caramba, tudo fechado. Havia a possibilidade de o assassino (de Argaña) ser brasileiro e o presidente fugir para o Brasil, e a delegação voltou para o hotel e ficamos esperando (a situação) se resolver”, disse o Velho Vamp. Por conta dessa possibilidade, os corintianos não puderam voltar ao Brasil no momento planejado.

“Ficamos mais um dia (no Paraguai), porque não dava para sair do país. Eu lembro que no dia seguinte fomos pescar, esperando resolverem a situação para sermos liberados para voltar ao Brasil”, contou. “Não foi uma morte natural, se dizia que era um golpe de estado e que envolvia brasileiro. Nós éramos uma equipe que estava representando o Brasil na Libertadores contra uma equipe paraguaia”.

Virada e assassinatos

O Corinthians saiu atrás na partida. Aos 32 minutos do primeiro tempo, Marcelo Paredes aproveitou uma bola sobrada dentro da área para mandar para as redes e abrir o placar para o Olimpia. A situação era delicada e o time brasileiro passou a pressionar pela virada, a qual só aconteceu na segunda etapa. Vampeta acertou um chutaço de fora da área para vencer o goleiro e deixar tudo igual aos 28 minutos. Pouco depois, Mirandinha recebeu de Ewerton dentro da área, saiu da marcação e devolveu para o próprio Ewerton virar o placar.

“Era um time forte do Olimpia. Eu lembro do Roque Santa Cruz, que está jogando até hoje. Lembro que tinha um atacante carequinha que jogava muito, (tinha) o volante Paredes. Eu fiz o gol de fora da área, fui comemorar, e depois disso teve a paralisação do jogo. Mas não tivemos ônibus apedrejado, não fomos maltratados no aeroporto, nem no hotel, nada disso”, lembrou Vampeta.

Se no Defensores del Chaco o Timão se deu bem, a situação no Paraguai era dramática. No ápice dos protestos contra o presidente Raúl Cubas, seis manifestantes foram assassinados na madrugada do dia 25 para o dia 26. O episódio ficou conhecido como o “Massacre do Março Paraguaio”. Na Praça da Independência, há uma placa em homenagem aos mortos durante os conflitos.

Histórias que não terminaram bem

O restante da história corintiana na Libertadores de 1999 os torcedores conhecem bem – e com certeza não gostam de lembrar. Depois de vencer o Olimpia em Assunção, a equipe goleou o adversário no returno, em São Paulo, por 4 a 0 e se classificou na primeira colocação do Grupo 3, com Palmeiras e Cerro Porteño na sequência e o eliminado Olimpia na lanterna (na época, só o último colocado não ia para o mata-mata). Nas quartas de final, o alvinegro enfrentou seu maior rival e, após duas vitórias para cada lado, o Verdão levou nos pênaltis a vaga para a semifinal do torneio do qual se sagraria campeão.

O desfecho para o Paraguai não foi menos complicado. Raúl Cubas não suportou a pressão pelo impeachment e renunciou ao cargo no dia 29 de março para fugir para o Brasil, onde posteriormente foi preso. Luis González Macchi, presidente do congresso, assumiu a presidência e, apesar da pressão dos militares que queriam conquistar o poder, manteve-se no cargo até abril de 2003, quando foram realizadas novas eleições.

Nicanor Duarte Frutos, do Partido Colorado, o mesmo de Oviedo, venceu as eleições presidenciais. Já Raúl Cubas, denunciado como cúmplice pelo atirador que matou Argaña, foi preso e cumpriu pena até 2007.

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