Desde a China! Turra abre o jogo e revela: campeão Palmeiras começou a ser forjado fora do Brasil

  • Por Jovem Pan
  • 10/12/2018 17h25 - Atualizado em 10/12/2018 18h23
Antônio Cícero/Photopress/Estadão Conteúdo Paulo Turra é auxiliar técnico de Luiz Felipe Scolari desde 2016

“O Palmeiras não foi campeão à toa.”

A frase é de Paulo Turra, membro da comissão técnica alviverde. E diz muito sobre a conquista do decacampeonato brasileiro. O Palmeiras de Luiz Felipe Scolari, campeão com o melhor turno da história dos pontos corridos, foi forjado a partir de muito trabalho.

Da busca pela verticalidade e fuga ao “mirabolismo” dentro de campo à união e respeito à hierarquia fora dele, o Verdão que conquistou o Brasil pela décima vez foi fruto de uma receita de sucesso que teve as suas primeiras linhas escritas na… China.

Em entrevista exclusiva à Rádio Jovem Pan, Paulo Turra, o braço direito de Felipão no trabalho que recuperou o prestígio do treinador após o 7 a 1, abriu o jogo. Revelou como os atletas eram orientados a atuar, compartilhou detalhes do dia a dia alviverde e contou que Felipão e seus auxiliares já sabiam como agir no Palmeiras antes mesmo de cruzar o planeta.

“Mesmo lá da China, nós já acompanhávamos o Palmeiras, pela ligação que o professor Felipe e que o (Carlos) Pracidelli (auxiliar) têm com o clube. Dentro disso, a gente já sabia, já tinha uma ideia do que iria pegar faltando quatro meses para o fim do campeonato”, afirmou Paulo Turra, que, assim como Felipão e Carlos Pracidelli, estava no Guangzhou Evergrande antes de ser convidado para voltar ao Palmeiras – ele já havia trabalhado no Verdão, mas como jogador, entre 2000 e 2001.

O conhecimento prévio do grupo alviverde facilitou o trabalho da comissão técnica de Scolari. Cientes das características dos jogadores, Felipão e Paulo Turra já desembarcaram no Brasil sabendo qual modelo de jogo implementariam no Palmeiras.

“A primeira coisa que nós conversamos foi: quando o adversário enfrentasse o Palmeiras, o que ele iria enfrentar? Que tipo de equipe? Esse foi o início do nosso trabalho: a definição de uma identidade dentro de campo. Como o modelo de jogo preferido do professor é o da verticalidade, de não ter a necessidade de cadenciar muito o jogo, nós já sabíamos que, pelas características dos jogadores, essa seria a maior possibilidade”, explicou Turra. “Quando chegamos, a primeira coisa que colocamos para os atletas foi essa questão da verticalidade. A gente cobrou intensidade na marcação sem a bola e jogar diretamente com ela… Não só diretamente, mas ter esse intuito de fazer transições mais rápidas”, acrescentou.

A resposta obtida dentro de campo, de acordo com o auxiliar, foi a melhor possível. “Os jogadores compararam a ideia, absorveram rapidamente, porque são inteligentes, e aí a gente foi evoluindo”, celebrou, valorizando também o rodízio implementado por Scolari. “O que nos ajudou bastante, também, foi a situação de trabalhar uma equipe para as Copas e outra para o Brasileiro, porque a gente conseguia trabalhar o time que não jogaria na semana com mais eficiência nos treinos. Essa identidade foi sendo construída com o passar do tempo e, agora, já está estabelecida. O Palmeiras, hoje, é conhecido pela verticalidade, pelos ataques no um contra um, pela jogada em cima do centroavante, pela marcação intensa, pelos desarmes… O time tem uma cara e, não à toa, foi campeão.”

Em campo, simplicidade

Paulo Turra dissecou o modelo de jogo do time campeão brasileiro em 2018. Apontado como o responsável por “colocar a mão na massa”, treinando a equipe sob a supervisão de Luiz Felipe Scolari, o auxiliar destacou a simplicidade do trabalho realizado pelo pentacampeão mundial e escolheu “equilíbrio” como a palavra-chave do Palmeiras que não perdeu sob o comando de Felipão na competição de pontos corridos.

“Se estávamos atacando pelo lado direito, o lateral desse lado tinha total liberdade para atacar. Não precisava se preocupar. Automaticamente, o lateral do lado oposto tinha de fechar como terceiro zagueiro. E o volante, independentemente se fosse o Felipe Melo ou o Thiago Santos, tinha de ficar à frente dos zagueiros. Sempre. Então, em uma situação de ataque, a nossa equipe ficava sempre com quatro jogadores atrás. Assim, a chance de ser surpreendida em um contra-ataque era bem menor. Por isso, a nossa equipe se acertou na defesa e tomou poucos gols”, lecionou.

“A retomada também foi algo que a gente trabalhou insistentemente. Perdeu a bola? Não fica se lamentando! Já tenta retomá-la o mais rápido possível. A nossa equipe, não à toa, foi a que mais roubou bolas no Brasileiro. Não teve muito mirabolismo. A gente apenas simplificou ações de treinos que se reproduziriam dentro dos jogos. E sempre deixando claro a importância do equilíbrio: você tem a melhor defesa? Então vai ter confiança para ter o melhor ataque! As duas transições, tanto ofensiva quanto defensiva, tinham de ser rápidas. Não teve muito segredo”, complementou.

Fora de campo, respeito à hierarquia

A gestão de um grupo considerado estrelado foi outro desafio enfrentado pela comissão técnica de Scolari. Trabalhar com jogadores do calibre de Felipe Melo, Dudu, Lucas Lima e Borja pode ser mais fácil do ponto de vista técnico, mas exige maior dedicação na condução do dia a dia. Egos inflados e competições internas podem fazer ruir qualquer possibilidade de sucesso. Nesse âmbito, de acordo com Turra, o segredo esteve na capacidade de Felipão de convencer os jogadores a assimilar as suas ideias, tanto dentro quanto fora de campo. “O Felipe é mestre nisso”, disse o auxiliar.

O rodízio do elenco e o tratamento igualitário dispensado aos atletas também foram, na visão do ex-zagueiro, determinantes para a manutenção de um clima de união e, acima de tudo, respeito à hierarquia. Turra abriu a “caixa preta” do elenco campeão brasileiro e externou situações que ajudam a explicar como o grupo alviverde se respeita fora das quatro linhas.

“Assim que chegamos, nós colocamos regras, mas nunca de maneira autoritária. Explicamos tudo. Por exemplo: os jogadores, a partir da nossa chegada, não poderiam utilizar celulares durante as refeições. Eles tinham de chegar no mesmo horário e, só quando todos estivessem juntos, poderiam começar a se servir. Após 20 minutos, o capitão Bruno Henrique dava a autorização, sempre com o aval do Felipão, e, aí, quem quisesse sair poderia sair”, contou.

“Outra coisa interessante é que eu e o Carlos Pracidelli nunca saímos do ônibus antes do professor Felipe. Nem em jogo, nem em treino. Nunca! No desembarque no aeroporto, o professor está sempre à frente da gente. Parece algo simples, mas, no contexto geral, faz muita diferença. Os jogadores observam essas ações, são inteligentes… Automaticamente, já assimilam, aí, o conceito de respeito à hierarquia. São coisinhas do dia a dia, mas que têm muita importância na construção de um grupo vencedor”, finalizou.

Afinal: quem é o “novo braço direito” de Felipão?

Sem Murtosa, que não acompanhou Felipão no Palmeiras por causa de problemas particulares, recaiu sobre Paulo Turra o status de “braço direito” do treinador pentacampeão mundial. Ex-zagueiro, Turra conheceu Scolari justamente no Palmeiras, time no qual jogou entre 2000 e 2001. Na ocasião, o defensor estava no Caxias e foi contratado por indicação de Murtosa.

Os laços com o técnico, no entanto, foram estreitados em Portugal. Felipão comandou a seleção lusitana de 2003 a 2008, e Turra jogou no país entre 2001 e 2006. Ambos se tornaram amigos durante esse período e, desde então, nunca perderam o contato. O ex-zagueiro se tornou treinador no último ano de Scolari em Portugal e, há duas temporadas, foi convidado pelo mentor para integrar a sua comissão técnica no Guangzhou Evergrande. Turra aceitou o convite prontamente e, menos de 700 dias depois, já ostenta o título de campeão brasileiro. Para muitos, será ele o sucessor de Scolari à frente do Palmeiras.

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