O que se sabe até o momento sobre a tragédia no Museu Nacional

  • Por Renato Barcellos/Jovem Pan
  • 04/09/2018 13h18 - Atualizado em 04/09/2018 14h43
EFE O Museu Nacional estava em situação irregular junto ao Corpo de Bombeiros

No último domingo, 2 de setembro, o Brasil assistiu a um dos mais trágicos incêndios da história do País.  O Museu Nacional, na Quinta da Boa vista, no Rio de Janeiro. ardeu em chamas, o que causou a destruição de quase todo seu acervo.

O fogo teve início, aproximadamente, às 19h30, quando quatro vigilantes estavam no local. Os trabalhadores conseguiram fugir a tempo. O Corpo de Bombeiros, chegou rapidamente ao local para o início do combate ao fogo, mas esbarrou na falta d’água nos hidrantes.

Apesar de não ter registrado nenhum ferido, o incêndio iniciou um extenso debate sobre as condições do museu. Falta de verba, má conservação, descaso da administração pública. Afinal, qual é a  equação que levou ao desaparecimento de uma parte da história do Brasil ?

A Jovem Pan separou em detalhes o que é sabido, até o momento, sobre o incêndio no Museu Nacional. Confira:

O que pode ter causado o incêndio?

A Polícia Civil do Rio de Janeiro abriu inquérito para investigar o caso e trabalha com duas possibilidades.

A primeira delas é a queda de um balão no teto do Museu Nacional. De acordo com o ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão, vigilantes da instituição revelaram que o fogo começou de cima para baixo, fazendo com que a queda do bolão se tornasse uma possibilidade.

Segundo o Artigo 42 da Lei de Crimes Ambientais, a Lei nº 9.605 de 12 de Fevereiro de 1998 diz que “fabricar, vender, transportar ou soltar balões que possam provocar incêndios nas florestas e demais formas de vegetação, em áreas urbanas ou qualquer tipo de assentamento humano”. A pena para descumprir a lei é de um a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

A outra possibilidade investigada é sobre o incêndio ter começado com um curto-circuito em um laboratório audiovisual do Museu. Com a crise da UFRJ, a instituição sofreu cortes orçamentários e de acordo com visitantes, o Museu contava com infiltrações, alas fechadas, fios aparentes, temperatura e luminosidade inadequadas para o acondicionamento dos itens das coleções, e até cupins.

O Museu Nacional estava em situação irregular junto ao Corpo de Bombeiros e não tinha portas corta-fogo.

Quanto material foi perdido?

A instituição contava com cerca de 20 milhões de itens e calcula-se que apenas 10% do material tenha sido salvo. As salas abrigavam coleções de geologia, paleontologia, botânica, zoologia, antropologia, arqueologia e entomologia.

No primeiro pavimento se encontrava o pátio onde foi assinada a 1ª Constituição do Brasil, em 1824. Próximo à recepção, podia se ver o Meteorito de Bendegó. A pedra que pesa cerca de 5,6 toneladas foi uma das peças que sobreviveu às chamas.

O segundo pavimento continha a maior coleção egípcia da América Latina, coleções de paleontologia, mineralogia e botânica, um acervo da etnologia indígena brasileira, a sala dos dinossauros – uma das mais visitadas do museu -, a sala que preservava os móveis originais de Dom João VI e, por fim, abrigava o crânio de Luzia, o mais antigo fóssil humano encontrado nas Américas, de 12 mil anos.

Entre outros itens importantes que o Museu hospedava estão o esquife (caixão egípcio) de Sha-Amun-en-su, da Época Baixa, 750 a.C, a Estrela Raia, do Império Novo, 1300 – 1200 a.C, a estatueta greco-romana Koré, do século V a.C, o sarcófago de Hori, do Terceiro Período Intermediário, 1049- 1026 a.C e o Cálice italiota de figuras vermelhas, da Campânia, do século IV a.C.

Bombeiros estavam sem água na hora do fogo?

Segundo testemunhas que passavam pelo local na hora do início do incêndio, o Corpo de Bombeiros teve dificuldade para puxar água e combater as chamas.

De acordo com o coronel Roberto Robadey Costa Júnior, a situação da água só foi normalizada quatro horas depois do Museu começar a pegar fogo, às 23h30. “Dois hidrantes, mais próximos, estavam sem carga (força) e pedimos para a Cedae desviar água para cá” explicou o coronel.

A falta de água atrasou o combate ao fogo, relatou o comandante do Corpo de Bombeiros. Um caminhão pipa com 30 mil litros foi enviado ao local mas a corporação, mesmo assim, precisou buscar água nas proximidades da instituição para diminuir o fogo.

“A falta de água atrasou em 30 a 40 minutos o combate ao fogo. Em 31 segundos, após o chamado, começamos a chegar ao Museu Nacional”, justificou o coronel da corporação.

Roberto Lehrer, reitor da UFRJ, criticou a forma como o Corpo de Bombeiros atuou e disse que o Museu tinha reserva de água. “A própria equipe da prefeitura, universitária e escritório técnico orientou os bombeiros onde buscar água. Tivemos certamente problemas de logística”.

Ainda segundo Costa Júnior, 80 bombeiros de 20 quartéis trabalham na tentativa de controlar o incêndio.

O Museu Nacional estava em situação irregular junto ao Corpo de Bombeiros e de acordo com a corporação, há um mês, a administração da instituição entrou em contato com os bombeiros para regularizar a situação. “A organização do Museu entrou em contato com nosso pessoal e teriam conseguido recursos [para regularizar a situação], mas não deu tempo”, relatou Robadey.

Verba realmente caiu nos últimos anos?

Como o Museu era mantido pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que passa por uma crise financeira, a instituição funcionava, há pelo menos três anos, com orçamento reduzido.

Para reabrir uma das salas mais importantes do acervo, onde ficava o dinossauro Dino Prata, o Museu chegou a abrir um financiamento coletivo com a meta de R$ 100 mil.

O repasse anual da UFRJ deveria ser de R$ 550 mil, mas, devido à crise que passa, há três anos, a instituição recebe apenas 60% deste montante. Sendo assim, o Museu não tinha recursos para pesquisa e manutenção.

Há mais de 15 anos, visitantes não podem ver o esqueleto gigante de uma baleia Jubarte devido à falta de recursos. Em 2015, o Museu chegou a fechar as portas por falta de pagamento a funcionários. Na época, o governo federal atrasou o repasse à instituição.

Quais eram os danos internos em manutenção?

Além de estar em situação irregular junto ao Corpo de Bombeiros, o Museu era extremamente frágil – devido a falta de preservação e restauração – e não tinha portas corta-fogo. A instituição também contava com paredes descascadas, fios elétricos aparentes, infiltrações, goteiras e infestação de cupins.

De acordo com uma relatório interno publicado em agosto de 2017, a área mais afetada era onde se guardava o acervo. “Há morcegos e gambás nos forros e ferrugens nos ferros expostos das marquises, convivendo servidores e usuários com plásticos pretos sobre estantes inteiras e baldes por praticamente todos os espaços, dejetos de animais sobre as paredes e estantes e o risco de gesso ou pedaços de concreto caírem sobre alguém ou equipamentos”.

O diretor do Museu Nacional, Alexander Kellner, disse em entrevista de 2017 que a instituição precisava de mais verbas para reformar o prédio. “O maior problema são as goteiras. Ficamos preocupados quando cai uma tempestade porque só temos verbas para medidas paliativas de prevenção”.

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