Os 40 dias que abalaram a República: relembre 13 derrotas sofridas por Dilma

  • Por Thiago Navarro/ Jovem Pan
  • 13/04/2016 15h28
Brasília - A presidenta Dilma Rousseff e o novo ministro da Casa Civil, Luiz Inácio Lula da Silva, durante cerimônia de posse (José Cruz/Agência Brasil) José Cruz/Agência Brasil A presidente Dilma Rousseff e o novo ministro da Casa Civil

No final do ano passado, após o presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) acatar o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o governo comemorou o imbróglio sobre o rito que determina os trâmites da ação, o que atrasou seu início para 2016. Dilma e seus aliados trabalhavam em prol da protelação acreditando que a economia poderia melhorar, o ânimo das ruas se acalmaria e o impeachment perderia força.

Hoje, porém, a poucos dias da votação do impedimento na Câmara, que deve ocorrer neste domingo (17), o cenário é bastante negativo para o governo Dilma. Com o mais recente abalo sofrido pela presidente, a saída do PP da base aliada e orientação favorável ao impeachment do PSD de Kassab e do PTB, o apertado “placar do impeachment” continua incerto, mas já sinaliza a derrota da petista. No Senado, onde o afastamento de 180 dias da presidente pode ser determinado, já há maioria mínima a favor do impeachment, pelo menos na intenção exposta pelos parlamentares.

Nos últimos 40 dias, pelo menos 13 acontecimentos abalaram o Palácio do Planalto, fragilizando como nunca a presidente Dilma. Relembre-os em ordem cronológica abaixo:

1) Delação de Delcídio – 3 de março

O conteúdo da delação do senador Delcídio do Amaral, ex-líder do governo, divulgado antecipadamente pela revista IstoÉ no começo de março, fez graves acusações contra Dilma e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Lula e sua sucessora tiveram os nomes citados por supostamente interferir na Operação Lava Jato.

Reação: O advogado-geral da União José Eduardo Cardozo, também citado na delação, classificou as denúncias como retaliação ao governo e disse que Delcídio não tem credibilidade. O estrago, porém, já estava feito.

2) Condução coercitiva de Lula – 4 de março

Apenas um dia depois, um acontecimento que mobilizou o País: o ex-presidente Lula foi alvo de condução coercitiva na 24ª fase da Operação Lava Jato. O ex-presidente respondeu perguntas sobre o Instituto Lula, sua empresa de palestras, o sítio de Atibaia e o apartamento tríplex no Guarujá, atribuídos a ele. Suspeita-se de que as empresas e os imóveis teriam sido usados para ocultar patrimônio e lavar dinheiro oriundo de empreiteiras investigadas, alegaram os procuradores. Durante o depoimento aos delegados da PF, Lula exigiu pedido de desculpas e abusou dos palavrões.

Reação: A presidente Dilma deu resposta à ação da Polícia Federal contra seu antecessor no mesmo dia. Ela manifestou o “mais absoluto inconformismo” contra a condução de Lula, mas preferiu ocupar boa parte de seu discurso defendendo-se das acusações de Delcídio publicadas no dia anterior.

3) Maiores manifestações políticas da história do País – 13 de março

Menos de duas semanas se passaram e pelo menos três milhões de brasileiros foram às ruas pedir a saída de Dilma. Esta foi a maior manifestação pública política da história do Brasil. Apenas na capital de São Paulo, 1,4 milhão de pessoas, segundo a PM e os organizadores (500 mil para o Instituto Datafolha), lotaram a Avenida Paulista.

Reação: O governo esboçou reação na sexta-feira seguinte (18), quando reuniu um expressivo número de 95 mil pessoas na Av. Paulista (Datafolha) a favor do governo Dilma (80 mil para a PM). Lula participou do ato, defendeu a democracia e juntou-se ao grito de “não vai ter golpe”.

4) Mercadante abalado – 15 de março

Vaza áudio gravado por assessor de Delcídio do Amaral em que supostamente o ministro da Educação Aloizio Mercadante oferecia ajuda para o senador, então preso, em troca de ele não fazer delação premiada (ouça aqui), o que configuraria obstrução da Justiça. Segundo a delação de Delcídio, a própria presidente Dilma teria enviado Mercadante ao encontro.

Braço direito de Dilma, Mercadante negou veementemente a interpretação dada ao conteúdo do áudio e disse que o assessor José Eduardo Marzagão tentou “induzir esse assunto” (de oferecer ajuda em troca da não delação).

Reação: Em nota, Dilma repudiou apenas “a tentativa de envolvimento do seu nome na iniciativa pessoal” de Mercadante. A presidente, entretanto, manteve o ministro no cargo.

5) Áudios divulgados por Moro – 16 de março

O juiz federal do Paraná Sergio Moro se tornou um grande protagonista político ao tornar públicos áudios de grampo realizado no celular do ex-presidente Lula. Algumas das conversas, inclusive uma entre Lula e Dilma, mostravam uma suposta trama para nomear o ex-presidente como ministro da Casa Civil a fim de lhe garantir foro privilegiado e retirar do Paraná as investigações que envolvem seu nome. A divulgação dos áudios se deu no dia em que Lula foi anunciado para o ministério e gerou mais protestos contra o governo.

Reação: Dois dias depois, Dilma criticou veementemente o juiz Sergio Moro e disse: “em muitos lugares do mundo, quem grampear um presidente vai preso”. Além de apontar a ilegalidade da divulgação de sua fala, Dilma alegou que tinha enviado o termo de posse antecipadamente para Lula, prática incomum, uma vez que a mulher do ex-presidente, Marisa Letícia, estava doente, o que poderia afastá-lo da cerimônia de nomeação para a Casa Civil.

6) Suspensão da posse de Lula – 18 de março

O governo antecipou para o dia 17 a posse do ex-presidente após a divulgação do áudio. Minutos depois da cerimônia no Palácio do Planalto, uma decisão liminar de um juiz federal do Distrito Federal sustou os efeitos da nomeação. Vários pedidos em relação à posse de Lula foram feitos e o caso foi parar no STF. No dia seguinte, Gilmar Mendes suspendeu a nomeação de Lula na Casa Civil, acatando os argumentos de que haveria indícios de obstrução da Justiça de desvio de finalidade no ato.

Reação: O governo recorreu da decisão, que ainda precisa ser julgada no plenário do Supremo (Lula continua suspenso). Dilma perdeu seu principal articulador para reconquistar a base política do governo no Congresso. Lula, no entanto, continuou conversando com políticos, na tentativa de ganhar apoio contra o impeachment de Dilma, atuando desde um hotel de Brasília.

7) Ministros do STF dizem que impeachment não é golpe – 23 de março

Em 23 de março, Moro divulgou uma lista que mostra repasses da Odebrecht para mais de 200 políticos e diversos partidos. Com poucos nomes do PT envolvidos, o governo reforçou o discurso de que o avanço do processo de impeachment de Dilma seria um “golpe”. Pelo menos dois ministros do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli e Cármen Lúcia, além do ex-ministro Carlos Ayres Britto, se manifestaram contra a fala de Dilma e relembraram que o impedimento está previsto na Constituição.

Reação: o governo recuou parcialmente do discurso e passou a dizer que “impeachment sem crime de responsabilidade é golpe”, enfatizando sua defesa contra o pedido protocolado na Câmara que seria analisado na comissão especial.

8) OAB protocola novo pedido de impeachment – 28 de março

Em meio a tumulto no Salão Verde da Câmara, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que costumava tomar decisões a favor do governo, protocolou um novo pedido de impeachment na Câmara. O presidente do órgão, Carlos Lamachia, disse não haver chance de nova Ditadura no Brasil. O presidente da Câmara Eduardo Cunha, no entanto, descartou despachar de imediato o pedido da OAB e deixou claro a prioridade do que já está em andamento.

9) Saída do PMDB da base aliada – 29 de março

Março ainda teve tempo de ver uma parceria de 14 anos se desmanchar. Aliado nos últimos três governos lulopetistas, o PMDB decidiu por aclamação deixar a base de apoio do governo.

Reação: Apesar da saída oficial da sigla, Dilma conseguiu manter seis dos sete ministros do partido no governo, uma parcial vitória na batalha pelos votos contra o impeachment. A presidente disse que não fará nenhuma reforma ministerial antes da votação do impedimento na Câmara.

10) Andrade Gutierrez compromete eleição de 2014 – 7 de abril

Na época em que o governo parecia retomar o fôlego e conseguir apoio contra o impeachment, trecho de delação da empreiteira Andrade Gutierrez vazou e jogou nova “bomba” no Planalto. O presidente da empresa e outros 11 executivos disseram em delação premiada que doações à campanha de Dilma de 2014 tiveram propina de obras superfaturadas. Apenas para a construção da usina de Belo Monte, teriam sido pagos R$ 150 milhões para o PT e o PMDB.

O fato abalou a corrida contra o impeachment porque aumenta as chances de Dilma ser destituída do poder mesmo se sobreviver ao impedimento, desanimando aliados. Há processos que correm no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e avaliam supostas irregularidades da chapa Dilma/Temer na última campanha presidencial. O caso deve ser julgado apenas no começo do ano que vem.

Reação: Em discurso, Dilma se pronunciou contra vazamentos “premeditados e direcionados com objetivo para criar ambiente propício ao golpe”. Ela previu que “poderemos ter nos próximos dias muitos vazamentos oportunistas e seletivos”.

11) Relatório favorável ao impeachment aprovado na comissão – 11 de abril

O relator da comissão especial do impeachment, Jovair Arantes (PTB-GO), fez relatório favorável ao impeachment, destacando as pedaladas fiscais de Dilma em 2015. O relatório foi aprovado por 38 dos 65 deputados na comissão.

O documento já foi lido em plenário e vai a votação até o próximo domingo (17), segundo estabeleceu Eduardo Cunha. O governo tentou, sem sucesso, mudar o dia da votação. Na data, já estavam programadas novas manifestações contra Dilma.

Reação: Dilma agradeceu os “27 heróis da democracia” que votaram contra o relatório de Jovair Arantes.

12) Áudio de Michel Temer – 11 de abril

A debandada de aliados parece apenas se intensificar. O vice-presidente Michel Temer, que já tinha se distanciado de Dilma após polêmica carta no ano passado, vazou um áudio em que discursava como se o impeachment já tivesse sido aprovado pela Câmara, defendendo um governo de “salvação nacional”.

Reação: Em duro discurso, a presidente Dilma acusou Temer de “traição” e de ser um dos “chefes do golpe” ao lado de Eduardo Cunha.

13) Saída do PP e possivelmente outros blocos do “centrão” –  12 e 13 de abril

No dia seguinte, Temer se reuniu com o líder do PP, Ciro Nogueira. O Partido Progressista, então, que estava sendo cooptado por Dilma para formar a nova base aliada, mudou de posição e anunciou o desembarque do governo, complicando o número das votações do impeachment para Dilma. O PRB, com 22 deputados, fechou questão pelo impedimento.

Já nesta quarta (13), o PSD do ministro Gilberto Kassab anunciou que a maioria de seus membros votará a favor do afastamento de Dilma. Sem unanimidade ainda, o PTB oficializou voto favorável ao afastamento de Dilma.

O temor do governo é de que outros partidos, até os nanicos, deixem a base e anunciem posição pró-impeachment. As negociações de Lula não foram suficientes para segurar na base de apoio as siglas do chamado “centrão” (partidos medianos, com força razoável de voto e sem muita posição ideológica definida).

Reação: Contando voto a voto na tentativa de reverter o placar que parece desfavorável, o governo liberou ao menos quatro ministros que têm mandato parlamentar para votar a favor de Dilma. Petistas também buscam fazer um corpo-a-corpo com os indecisos.

As negociações devem durar toda a semana e novos fatos políticos podem influenciar os votos dos deputados.

Fotos: Lula (EFE); Manifestação (Rovena Rosa/Agência Brasil), Posse de Lula (EFE/Fernando Bizerra Jr), Votação do PMDB (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil); Jovair Arantes (Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados)

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