Felipe Moura Brasil: A vantagem da histeria alheia

  • Por Felipe Moura Brasil
  • 20/07/2019 17h00 - Atualizado em 20/07/2019 17h05
Divulgação Jornais empilhados em banca A incapacidade de argumentação racional e o consequente recurso a ataques pessoais geram rejeição ao lado apelativo e popularidade ao seu oposto, se ambos têm voz no debate público.

A incapacidade de argumentação racional e o consequente recurso a ataques pessoais geram rejeição ao lado apelativo e popularidade ao seu oposto, se ambos têm voz no debate público.

A hostilidade da esquerda à divergência e à crítica a seus pares fez o Brasil virar à direita. Uma direita em parte ingênua, por não ter entendido a vantagem de deixar o adversário mostrar sua natureza; e em parte reacionária, no mau sentido, por querer devolver o silenciamento de vozes antagônicas, como se o grande público fosse incapaz de notar a histeria esquerdista; e os contendores direitistas, de lidar e se beneficiar com ela, impondo-se pela razão e pela elegância, muito mais que pelo tempo com a palavra.

A direita incipiente e virtual brasileira, com uma ou outra exceção, não aprendeu a separar a sua indignação absolutamente legítima ante comportamentos estúpidos de adversários culturais ou políticos e o efeito no ambiente cultural da exibição e da descrição desses comportamentos.

Em 16 anos como colunista, a maior parte dele sob governos do PT – sob ataque de militantes infiltrados na velha imprensa e blogueiros sujos sustentados com verba de publicidade de estatais controladas e roubadas por petistas -, jamais pedi a cabeça de esquerdistas a empresas privadas, nem cobrei o cancelamento de suas participações em eventos (embora tenha criticado o uso de dinheiro público em falsos debates de uma patota só).

Defendi, pelo contrário, que escrevessem e falassem mais, para que eu pudesse refutar suas mentiras, apontar suas distorções e expor seus métodos, sobretudo o cinismo em meio à corrupção sistêmica. Não fui o único nem o primeiro a fazê-lo. Mas conquistei assim meu espaço e abri vários outros ao debate plural, temido pela esquerda seguidora do ideólogo Antônio Gramsci, que pregava o boicote silencioso ao lado contrário.

Hoje, porém, parte da direita virtual usa as redes sociais para pedir cabeças e assinar manifestos contra a presença de profissionais que ela repudia e despreza, legitimando o vitimismo alheio e acusações adversárias de autoritarismo.

Como faz Jair Bolsonaro com seus filhos (Carlos, quando usa as redes do pai para atacar integrantes e aliados do governo; Eduardo, indicando à embaixada brasileira em Washington; Flávio, elogiando decisão de Dias Toffoli de suspender milhares de investigações ao atender a pedido do atual senador), essa parcela da direita ainda mima seus profissionais queridos, como se eles precisassem ser salvos da esquerda malvada, e não estivessem no embate por livre, espontânea e remunerada vontade.

Quando se cruza a linha das acusações criminais infundadas – que podem render processos judiciais – e da adjetivação grosseira e paranoica de autoridades e cidadãos que não estão presentes para se defender, é natural que qualquer empresa séria advirta ou, em caso de insubordinação, afaste seus profissionais; mas o debate presencial ácido e o evento isolado onde o palestrante maldiz seus alvos fazem parte do jogo democrático.

Nesses casos, perante o grande público, que vai muito além de ativistas de esquerda e direita, o comportamento desrespeitoso, se bem rebatido ou descrito, só desgasta quem nele incorre.

* Felipe Moura Brasil é diretor de Jornalismo da Jovem Pan.

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