Mafalda: “Para que queremos juízes? Para que decidam contra lei?”

  • Por Reinaldo Azevedo/Jovem Pan
  • 09/02/2017 07h57
Reprodução REP - Mafalda: “Para que queremos juízes? Para que decidam contra lei?”

O que há de grave em juiz federal de Primeira Instância conceder uma liminar para suspender a nomeação de um ministro de Estado? Bem, quase nada além do fato de o ato ser escancaradamente ilegal. É mesmo um espanto!

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Pior: da forma como a coisa veio à luz, é evidente que o distinto público está sendo enganado, tenha sido essa a intenção ou não. O não especialista, a esmagadora maioria, é levado a acreditar que o bugalho de um doutor é igual ao alho do outro. Explico.

Refiro-me, claro, à decisão do juiz da 14ª Vara Federal de Brasília, Eduardo Rocha Penteado, que suspendeu a nomeação de Moreira Franco para a Secretaria-Geral da Presidência. Argumento do juiz: o presidente Michel Temer só tomou essa decisão para conferir a Moreira foro especial por prerrogativa de função — isto é, para que ele só possa ser processado perante o STF. Para o juiz, fica caracterizado o desvio de finalidade. E, ora vejam, tentou ancorar suas barbaridades em Mandado de Segurança relatado por Gilmar Mendes, que suspendeu a posse de Lula na Casa Civil em 2016.

A quantidade de impropriedades cometidas pelo juiz assombra. Lê-se isto em sua decisão: “É dos autos que Wellington Moreira Franco foi mencionado, com conteúdo comprometedor, na delação da Odebrecht no âmbito da Operação Lava Jato. É dos autos, também, que a sua nomeação como Ministro de Estado ocorreu apenas três dias após a homologação das delações, o que implicará a mudança de foro”.

Desmonto

Não é dos “autos”. Onde estão os “autos”? O que se tem, por enquanto, é o vazamento de uma delação.  Moreira Franco nem é ainda investigado. O que o magistrado chama “autos” são notícias da imprensa. Se e quando houver a investigação oficial, pensa-se a respeito.

Na sua espantosa ousadia, foi além: “Sendo assim, indícios análogos aos que justificaram o afastamento determinado no Mandado de Segurança nº 34.070/DF se fazem presentes no caso concreto. Não há razão para decidir de modo diverso no caso concreto”.

O Mandado de Segurança 34.070 é aquele relatado por Mendes, que concedeu liminar e suspendeu a posse de Lula para a Casa Civil.

Por que um bugalho não é um alho?
Será tudo a mesma coisa? Uma ova! Em primeiro lugar, Lula já era oficialmente investigado quando foi nomeado. E a rede petralha gritava dia sim, dia também, que ele seria preso por Sergio Moro. Gravações que vieram a público demonstraram a clara intenção de obstruir o trâmite normal da Justiça, uma vez que se tornou evidente que o objetivo da nomeação era tirar o ex-presidente da alçada de Moro.

Em segundo lugar, Moreira é um ministro de fato do governo Temer desde o primeiro momento. Qualquer um sabe que tinham mais proximidade com o presidente do que boa parte dos que já gozavam do status de ministro. Só não carregava esse nome porque, à época, o fetiche do corte de pastas se tornou influente.

Em terceiro lugar — na ordem de argumentação, não de importância, porque este item é o mais relevante —, um juiz de Primeira Instância não tem competência para sustar um ato do presidente da República que concerne a funções que lhe são exclusivamente concedidas pela Carta Magna. Trata-se do chamado “controle de constitucionalidade — privativo, nesse assunto, dos membros do Supremo. Ainda que as situações fossem idênticas, e não são, o doutor tem de se lembrar quem é ele e quem é Gilmar Mendes. Vale dizer: cada um deles tem a sua esfera de competência.

Um juiz federal pode sustar um ato do Poder Executivo? Pode! Desde que não esteja usurpando uma competência de outro tribunal.

A Advocacia-Geral da União já recorreu contra a decisão, que será certamente derrubada, sem que seja necessário nem mesmo entrar no mérito da argumentação.

A usurpação de competência do juiz Eduardo Rocha Penteado é maior do que parece. Afinal, já existe no Supremo um Mandado de Segurança impetrado pela Rede contra a nomeação de Moreira. A Rede é aquele partido viciado em tapetão e que não consegue eleger ninguém. O relator dessa ação é Celso de Mello.

Encerro
É claro que se trata de um troço grave. O clima de bagunça que existe no país, comandado por aqueles que pretendem usar a Lava Jato para submeter o país à ditadura dos voluntariosos, contamina, como se vê, o Poder Judiciário.

Como perguntaria a Mafalda, de Quino, “para que queremos juízes?”.

Certamente não é para que decidam contra a lei.

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