O Incra teve um surto de bom senso e vai apanhar do MST

  • Por Jovem Pan
  • 26/01/2015 10h18

Reinaldo, você vai elogiar um documento de um órgão do governo federal?

Vou sim, sou um homem sem preconceitos. Quando é o caso de elogiar o governo, eu elogio. Se o faço tão pouco, é porque o governo não acerta quase nunca. Mas vamos lá! O Incra, quem diria?, teve um surto de bom senso. E vai apanhar do MST por isso, é claro!, e de outros esquerdistas desinformados ou mal-intencionados. Por que isso? Vamos ver. A Folha informa que um documento do órgão já não defende mais, e esta é uma boa notícia, a chamada revisão do índice de produtividade rural. Fazer essa revisão é uma bandeira histórica do PT e dos ditos sem-terra. Só para lembrar: o programa da candidata Dilma Rousseff em 2010 pregava: “continuar, intensificar e aprimorar a reforma agrária de modo a dar centralidade ao programa na estratégia de desenvolvimento sustentável do país, com a garantia do cumprimento integral da função social da propriedade, da atualização dos índices de produtividade, do controle do acesso à terra por estrangeiros (…)”.

Mas que diabos vem a ser esse índice de produtividade, o que se quer com a revisão, quais seriam as suas implicações e por que o MST a defende tanto? Vou tentar explicar.

O tal índice de produtividade é estabelecido com base em dois critérios: o GUT (Grau de Utilização da Terra) e o GEE (Grau de Eficiência da Exploração). Uma sigla se refere à ocupação da área e a outra à produtividade física propriamente dita. Noto à margem: ninguém define qual deve ser a produtividade de uma planta industrial ou qual é o limite da propriedade urbana ― e não tem de definir mesmo. Mas observem que o proprietário rural, coitado, é tratado quase como um usurpador ou, sei lá, o dono precário de uma área: ou se justifica ou perde o que “quase” lhe pertence.

O critério, sem mudança, já é um tanto burro. Vamos ver. É produtiva a terra que atinja 80% do GUT e 100% do GEE ― e o governo define os índices de cada região. Preste atenção! Tomemos duas propriedades, A e B, ambas com mil hectares, por exemplo. A primeira tem o GUT de 80%, o mínimo necessário, e também produz o mínimo exigido, mas bem menos do que a propriedade B, que recorre à tecnologia, ocupando, no entanto, apenas 70% da área. Qual seria a propriedade improdutiva? Bidu! Aquela que produz mais. É uma burrice. Só que os que querem rever isso, não querem melhorar o critério, eles querem piorar.

Os índices atuais, dizem os defensores da mudança, são de 1975 e precisariam ser atualizados. Não deixa de ser curioso: quanto mais o empresário rural investe, então, em tecnologia e produtividade, mais põe a sua propriedade em risco, já que aumentam as exigências. Torna-se, assim, como categoria vítima de sua própria eficiência.

Caso se mexesse no tal índice, aconteceria o quê? Ora, nos últimos anos, a produtividade rural cresceu muito, e o que antes era produtivo poderia ser considerado improdutivo pelos novos critérios. Isso teria dois efeitos: a) seria ampliada a área total potencialmente desapropriável – que hoje é residual nos estados do Sul e do Sudeste, regiões que concentram o maior contingente de sem-terra; b) o MST lançar-se-ia, então, numa nova e formidável campanha de invasões.

No novo documento do Incra, assinado por Carlos Guedes, afirma-se com correção: “A disseminação da tecnologia está permitindo que haja uma homogeneidade dos índices alcançados de produtividade física. São poucas as propriedades rurais com boas terras e bem localizadas que sofrerão a sanção constitucional da desapropriação em função dos indicadores de produtividade física”.

O MST não gostou da mudança de postura do Incra, dando mais um indício de que ela deve, então, estar certa. “É com preocupação que a gente vê essas coisas. Houve uma mudança de ideologia quanto a desapropriar terras, o Incra não busca mais enfrentar o latifúndio”, afirma Alexandre Conceição, da coordenação nacional do movimento. Vai ver, senhor Alexandre, que isso acontece porque praticamente não há mais latifúndio no Brasil.

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