Houve locaute e movimento horizontal dos caminhoneiros, diz Jungmann

  • Por Jovem Pan
  • 28/05/2018 11h05 - Atualizado em 28/05/2018 11h10
BRUNO ROCHA/FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO Jungmann disse ser difícil prever, a partir de manifestações promovidas pela internet, "qual delas vai 'pegar', qual delas não vai 'pegar'"

O ministro da Segurança Pública Raul Jungmann, responsável pela Polícia Federal (PF), diz que a constatação do governo de que a greve dos caminhoneiros se tornou um movimento difuso incentivado pelas redes sociais não descarta a primeira avaliação de que houve locaute, quando empresas impedem seus funcionários de trabalhar.

O ministro informou que a PF já abriu 50 inquéritos para apurar a participação de transportadoras no movimento dos caminhoneiros que provocou uma crise de abastecimento pelo País. Representantes das companhias ouvidos pela Jovem Pan, como a Fetcesp (Federação das Empresas de Transporte de Cargas do Estado de São Paulo), negam o locaute e acusam o governo de “buscar um bode expiatório”.

Para Jungmann, as duas percepções, de locaute e de movimento disperso, “são contraditórias, mas ao mesmo tempo complementares”.

“Uma coisa não elimina a outra. Você tem um movimento que de fato é horizontal, mas você teve o apoio das grandes empresas transportadoras e distribuidoras, isso está amplamente constatado pela Polícia Federal”, disse Jungmann em entrevista exclusiva ao Jornal da Manhã desta segunda-feira (28).

“A greve está acabando”

Apesar das concessões do governo federal aos caminhoneiros, Jungmann reconheceu que o movimento ainda não terminou. “A greve está acabando”, disse o ministro, prevendo uma redução gradual das mobilizações.

Os primeiros boletins recebidos pela Polícia Federal dão conta da queda de paralisações”, disse o ministro, citando que ainda há paralisias parciais em rodovias. “Vamos ter uma redução paulatina daqueles que permanecem paralisados, haja vista que a a pauta foia atendida amplamente pelo presidente da República”, avaliou.

Jungmann destacou que o governo está permitindo o abastecimento de postos e aeroportos por meio de escoltas, mas que “o governo não pode substituir o mercado, e o mercado inteiro se paralisou pela greve dos caminhoneiros, que contava e conta ainda, não sei, com o apoio de empresas”, disse.

“Não tem forças armadas, não tem PRF (Polícia Rodoviária Federal), que substitua o mercado”, afirmou.

Governo não previu tamanho

Jungmann admitiu também que o governo federal não acreditou nos primeiros anúncios de greve dos caminhoneiros, que ameaçavam para o Brasil. “Todo movimento costuma exacerbar a sua capacidade de impacto e paralisação. Todo movimento sindical de movimento nacional se propõe a fazer isso e não tem como você acreditar que isso possa acontecer”, minimizou o ministro.

“Não foi o sindicalismo tradicional que paralisou o País”, ressaltou novamente Jungmann, destacando o “movimento de redes”.

Primavera Árabe

Para justificar a demora do governo federal em negociar e tentar conter o movimento, Jungmann comparou a greve dos caminhoneiros a outras mobilizações fomentadas por participação difusa nas redes sociais e liderança horizontal.

“Como se relacionar com as redes, onde os líderes surgem espontaneamente no meio do processo, eles não têm experiência de negociação sindical e não têm uma visão sobre relação institucional entre governo e sindicatos?”, questionou o ministro, que reconheceu que o governo de Michel Temer encontrou “dificuldades em negociar” devido ao excesso de lideranças.

“(A greve) se espalhou pelo País a exemplo do que ocorreu mundo a fora, como na Primavera Árabe e 2013 no Brasil”, comparou Jungmann, lembrando as massivas manifestações em países do norte da África e Oriente Médio em 2010, que cresceram após um jovem tunisiano atear fogo ao corpo em protesto, e as manifestações em junho de 2013 que começaram em atos contra o aumento de R$ 0,20 no transporte paulistano e se espalharam pelo País. O ministro também citou o movimento “Occupy Wall Street”, em ato contra o sistema financeiro em Nova York.

“Todos os modelos mundo afora têm dificuldade de lidar com essa paralisação”, disse Jungmann. “Tínhamos a tradição de lidar com o coletivo. Hoje ao lado disso você tem as redes, que pode ‘pegar’ ou ‘não pegar'”, contrastou o ministro, dizendo ser difícil prever, a partir de manifestações promovidas pela internet, “qual delas vai ‘pegar’, qual delas não vai ‘pegar'”.

“Vale a crítica pela questão da percepção (do governo Temer sobre a greve), mas é uma crítica que todos os governos enfrentam hoje”, relatou. “Se você tem uma crise econômica e uma deslegitimação da política, basta uma ignição”, afirmou.

Forças armadas

Sobre o uso das forças armadas para desobstruir estradas, Jungmann destacou que elas não são utilizadas “necessariamente com um efeito de debelar, mas porque ninguém tem a capilaridade e os recursos humanos que elas têm”.

O Exército também sobre o guarda chuva de responsabilidades do ministério de Segurança Pública, criado por Temer após o decreto de intervenção no Rio de Janeiro. Jungmann informou que o já foram estabelecidas 11 garantias da lei e da ordem para enfrentar a “crise de segurança” nacional.

Caso a greve dos caminhoneiros suscite outras manifestações de outras categorias, o ministro descarta o uso de força irrestrita.

“Não tem como fazer repressão num sistrema democrático. Isso vai partir da Justiça, mas sempre dentro da lei e do Estado democrático de direito, que o sistema faz questão de seguir e dele não abre mão”, garantiu.

Ouça a entrevista completa:

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